Poesia Quase Todo Dia

a voz é a coisa mais bonita que uma boca pode fazer sozinha


Listen Later

“violinista nos cobogós” é um poema que escrevi este ano. espero que goste.

o que você acha dessas coisas

todas que fizemos?
há um imóvel no centro onde
as escadas têm mais cupins do que
há moradores no centro
e as asas deles cobrem o chão
como saias caídas de virgens
guardanapos num restaurante chique
há certas coisas tocando o chão
que foram destinadas à boca
há bocas que desconhecem seu papel
e por isso na praça ao lado dos imóveis vazios
pode-se ver pessoas esfomeadas
com a mesma naturalidade que se vê
atrás dos vidros de shoppings
barrigas cheias e cabelos armados de laquê
(o cuspe das madames contém mais calorias
que muitos ceps)
a última vez em que fui a uma ópera chorei
(me senti old money)
nunca chorei em jogos de futebol
choro em filmes
com músicas
não choro lendo livros
de certa forma homens e palavras não
me causam nenhum espanto
mas a voz sim
a voz é a coisa mais bonita que uma boca
pode fazer sozinha
quase todas as outras belezas demandam
dois ou mais pares de bocas
mas ainda há palavras belas o bastante
para serem ditas em solidão
como um nome próprio ou a estrofe final
de um poema do arvis viguls que diz:
determinam a idade de um cavalo pelos dentes,
a idade das dores – pelas cicatrizes
e, no entanto, ainda sou muito jovem
aqui – e isso precisa ser dito num sussurro –
ainda há espaço de sobra



This is a public episode. If you would like to discuss this with other subscribers or get access to bonus episodes, visit newsletter.eduardofurbino.com
...more
View all episodesView all episodes
Download on the App Store

Poesia Quase Todo DiaBy Eduardo Furbino