Espiritualidade Católica

Diferenças entre a vontade divina significada e a vontade divina de beneplácito


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Existem profundas diferenças entre a vontade divina significada e a vontade divina de beneplácito.

Primeira diferença. A vontade significada já nos é conhecida de antemão, geralmente de maneira claríssima. Desta maneira, conhecemos o Evangelho, as leis da Igreja, os conselhos, etc. De maneira muito conatural, podemos entender a vontade de Deus, confiá-la à nossa memória e meditá-la. As inspirações só parecem desconhecidas de antemão, mas na verdade elas têm por objeto aquilo que já é conhecido. Ao contrário, a vontade de beneplácito quase nunca se conhece com antecedência, mas sim durante o próprio acontecimento ou só depois dele. Dizemos quase, porque há exceções. O que Deus fará mais tarde, podemos conhecê-lo de antemão, se a Deus lhe apraz dizê-lo. Também se pode pressentir, conjecturar, adivinhar, seja pelo rumo atual dos fatos, seja pelas escolhas feitas anteriormente. Mas, em geral, o beneplácito divino é descoberto na medida em que os acontecimentos vão se desenvolvendo. Ainda no próprio momento em que ocorrem, muitas vezes a vontade de Deus permanece muito obscura. Por exemplo, Ele nos envia uma enfermidade, ou uma secura interior, ou outras provas. No momento em que isso ocorre, já sabemos que é essa a sua vontade, mas não sabemos se será longa ou curta, ignoramos o resultado, muita coisa ainda fica desconhecida.

Segunda diferença entre a vontade divina significada e a vontade divina de beneplácito. Nós podemos obedecer ou desobedecer a vontade de Deus significada. Ele quer colocar em nossas mãos a vida e a morte, nos deixando o poder de escolher entre obedecer sua lei ou desrespeitá-la. Essa nossa liberdade dura apenas até o dia da justiça. Ao contrário, pela sua vontade de beneplácito, Deus dispõe de nós como Soberano. Não nos consulta, e às vezes atua até mesmo contra nossos desejos. Ele nos coloca na situação que nos preparou, e nela nos propõe o cumprimento dos deveres. Fica dependente de nossa liberdade o cumprir ou não esses deveres, submetermo-nos ao beneplácito ou nos comportarmos como rebeldes; mas é preciso aguentar os acontecimentos, queiramos ou não, não havendo poder no mundo que possa deter seu curso. Por esse caminho, como governador e como supremo juiz , Deus restabelece a ordem e castiga o pecado; como Pai e Salvador, nos recorda nossa dependência e procura nos fazer entrar nos caminhos do dever, quando tivermos nos emancipado e extraviado.

Terceira diferença entre a vontade divina significada e a vontade divina de beneplácito. Deus nos pede a obediência à sua vontade significada, como consequência de nossa escolha e de nossa própria determinação. Para seguir um preceito, para produzir atos de virtude teologal ou moral, certamente precisamos de uma graça secreta que nos precede e nos ajuda, graça que nós podemos alcançar sempre pela oração e pela fidelidade. Mas ainda quando a vontade divina nos seja claramente significada, a cumprimos por nossa própria liberdade de escolha. Não precisamos esperar um movimento sensível da graça, nem uma moção especial do Espírito Santo. Pelo contrário, na vontade divina de beneplácito, é necessário esperar que Deus a declare mediante os acontecimentos. Sem essa declaração, não sabemos o que Ele espera de nós. Com ela, conhecemos o que Ele deseja de nós: primeiro, a submissão à sua vontade; depois, o cumprimento dos deveres peculiares a tal ou qual situação que Ele nos tenha dado.

São Francisco de Sales faz uma observação muito correta. Há situações em que é preciso juntar a vontade divina significada com a vontade divina de beneplácito. E cita como exemplo o caso da enfermidade. Além da submissão à Divina Providência, será preciso cumprir os deveres de um bom doente, como a paciência e a abnegação, e permanecer fiel aos mandamentos da vontade significada, nos limites da doença. O santo Doutor insiste muito que nessa concorrência de vontades, enquanto o beneplácito divino nos seja desconhecido, é necessário nos aderir o...
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Espiritualidade CatólicaBy Danilo B. M.