O Peixe ou a Cana de Pescar
O debate sobre ensinar conteúdos ou desenvolver competências na educação é antigo e recorrente. Historicamente, o ensino focava-se na memorização, como ilustrado no filme Pelle, o Conquistador, onde crianças repetiam mecanicamente o alfabeto. Esse modelo reflete uma época em que a psicologia e as neurociências ainda não haviam avançado para compreender as capacidades cognitivas humanas.
O século XX trouxe mudanças com figuras como Freud, Dewey, Montessori e Freinet, que enfatizaram a importância do raciocínio, da dedução e da aprendizagem ativa. Contudo, em Portugal, o regime do Estado Novo retardou essas inovações, e só nos anos 80 novas perspetivas educacionais ganharam força. Na década de 90, Roberto Carneiro liderou uma reforma que passou a valorizar não apenas conteúdos, mas também comportamentos e atitudes. Em 2008, surgiram áreas curriculares "não disciplinares" e, em 2017, foi implementado o Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória, priorizando competências em detrimento da simples transmissão de conhecimentos.
Essa transição gerou resistências, especialmente de setores conservadores da educação. A alternância entre a ênfase em conteúdos e competências parece seguir um ciclo, como ocorre com a História, onde tendências vão e voltam. A China, por exemplo, observa essas mudanças com mais serenidade, sem polarizações radicais.
O ser humano, como entidade biológica, processa informações de três fontes: a genética, a aprendizagem herdada e a adaptação às mudanças. Enquanto alguns animais, como o crocodilo do Nilo, sobrevivem apenas com informação genética, os grandes felinos e os humanos precisam de um período de aprendizagem para se adaptar. Essa capacidade de aprender e evoluir diferencia nossa espécie, exigindo um equilíbrio entre conhecimentos acumulados e habilidades para lidar com o futuro.
O autor sugere o conceito de Património de Conhecimentos Acumulados pela Humanidade (PCAH), ressaltando que, embora desenvolver competências seja essencial, a memorização de fatos históricos e científicos continua crucial. Como exemplo, menciona a teoria da Terra plana e a necessidade de ensinar fatos básicos, como a experiência de Eratóstenes ao medir a circunferência da Terra há mais de dois mil anos.
A solução não está em escolher entre "dar o peixe" ou "ensinar a pescar", mas sim em integrar ambos os métodos. Ao invés de tratar conteúdos e competências como rivais, o ideal é buscar um equilíbrio que fortaleça o pensamento crítico e a capacidade de adaptação dos alunos ao mundo em constante mudança.