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O QUE VOCÊ GOSTARIA DE SABER SOBRE A UCRÂNIA E NÃO TEM A QUEM PERGUNTAR


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Por Michael Winetzki
Meu pai nasceu em uma pequena aldeia na Ucrânia em 1917. Havia então no país uma grande comunidade judaica. Estudou na Escola Militar de Odessa, foi aluno brilhante e matemática e física e tornou-se capitão de artilharia, responsável pelos cálculos que permitiam estabelecer as trajetórias balísticas dos obuses.
Em memória a meu pai vou falar um pouco de seu país natal.
Com a divisão do Império Romano e o estabelecimento de Constantinopla, como a capital do Império Romano do Oriente, esta tornou-se uma das cidades mais ricas, belas e afluentes do mundo.
Situada geograficamente em um ponto estratégico, no estuário chamado pelos gregos de Chifre de Ouro, como se fosse o imenso chifre de um touro mitológico encravado no Mar de Bósforo que dividia o lado europeu com o lado asiático do Mar de Mármara.
A cidade foi reconstruída pelo Imperador Constantino sobre uma pequena cidade já existente, Bizâncio, e é privilegiada com um profundo porto natural que facilitava o comércio para todas as civilizações que lá estiveram, desde os gregos e romanos, até os otomanos.
A cidade tinha poderosas fortificações e uma das mais notáveis era a pesadíssima corrente de mais de um quilometro de extensão com elos de ferro de mais de um metro de largura que formavam uma barreira flutuante intransponível para que navios inimigos não tivessem acesso à cidade.
Em 1204 as galeras venezianas utilizadas pela Quarta Cruzada lograram romper a corrente e saquearam a cidade destruindo tudo o que puderam. Em nome de Cristo cometeram atrocidades inenarráveis.
Os vikings, que os bizantinos chamavam de varegues e nós chamamos de eslavos, muito fortes, altos e loiros, como são exibidos pela mitologia, hábeis navegantes e intrépidos cavaleiros, vindos das regiões nórdicas onde estão a Escandinávia e a Noruega, em seus leves navios com uma tecnologia de casco simétrico que permitia manobras bruscas e rápidas também estiveram em Constantinopla que eles denominavam Michelgard.
Conta a lenda que o viking Harald Hadraade, ou ainda Harald o Severo, Rei da Noruega, conseguiu se apropriar de muitos dos tesouros de Constantinopla, inclusive daqueles que foram roubados do Templo de Jerusalém. Ele morreu em batalha, porém os vikings liderados por Ascoldo e Dir prosseguiram em seus navios para a Europa Oriental através dos inúmeros rios daqueles territórios, ora negociando, ora saqueando, até o Rio Dnieper, onde tomaram a Fortaleza de Kiev e no século IX fundaram o reino viking de Rus, chamado de Rus de Kiev, a origem das atuais nações Ucrânia e Rússia, num vastíssimo território que atualmente engloba Ucrânia, Rússia e Belarus até o Mar Báltico.
Desta forma desde sua origem existem fortes laços em comum na história, cultura, religião e comportamento. Kiev permanece como capital da Ucrânia e a cidade de Moscou só seria fundada no século XII. Vladimir 1º de Kiev (São Vladimir “o Grande” para a Igreja Cristã Ortodoxa) consolida o Reino Rus e impõe a religião cristã ortodoxa por volta do ano mil.
Entretanto nos séculos seguintes uma sucessão de conflitos e conquistas irá estabelecer novos costumes e identidades culturais para os povos que habitam a porção oeste. Em meados do século 13 o domínio pelos mongóis. No final do século 14, o território é dividido entre o Grão-Principado de Moscou e o Grão-Ducado da Lituânia (que mais tarde se juntou à Polônia). Depois foi governada pela dinastia dos Habsburgo dos impérios Austríaco e Austro-Húngaro. Assim, essa porção ocidental do país teve uma história diferente daquela vivida no leste ucraniano e isso aumentou as influências europeias ocidentais.
Do lado leste, a margem oriental do Rio Dnieper, vasto território onde fica a Criméia o desenvolvimento político e cultural foi diferente. Houve forte influência dos tártaros, gregos e otomanos, até que ocorreu o domínio pelo Império Russo que expandiu suas conquistas até o centro do país até então controlado pela Polônia. Do lado oeste as terras passaram da Polônia para o Império Austríaco.
Em função destas e de muitas outras mudanças de governo e da imposição de múltiplas culturas o professor de estudos ucranianos da Universidade College London, Andrew Wilson, (apud bbb. news) ensina que “deve se ver a Ucrânia, tanto pelo seu território quanto pela sua identidade, mais como um quebra-cabeças dinâmico do que como uma unidade estanque”.
Enfim, ao longo dos séculos ocorreram inúmeras mudanças que não nos cabe descrever numa pequena apresentação. A partir de 1917, pós-revolução Russa, ocorre a criação da União Soviética, que unifica sob um governo central de Moscou diversos países, incluindo a Ucrânia.
Deve se destacar a marca de uma grande tragédia, o “Holodomor”, a Grande Fome de 1932 a 1934, quando o ditador Stalin se apropria de toda a produção de alimentos do país para punir sua “insolência nacionalista”. Apesar deste evento não constar na história oficial da União Soviética tem se como certo que pelo menos sete milhões é o número de pessoas mortas pela fome na Ucrânia.
No dia de Natal de 1991 a União Soviética foi dissolvida e todas as nações que compunham a União Soviética se tornaram independentes, embora pró-Rússia, com exceção da Ucrânia que declarou “status” de neutralidade e buscou aproximação maior com a Europa e com a OTAN. Porém em 2013 o presidente Victor Yanukovich suspendeu os acordos de parceria com a União Europeia e buscou maior aproximação com a Rússia gerando protestos e manifestações populares que duraram vários meses e ficaram conhecidas como Euromaidan ou Revolução da Dignidade.
O governo foi derrubado e assumiu um novo Presidente.
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Malhete PodcastBy Luiz Sérgio F. Castro