No Brasil nunca assistimos as grandes emissoras de televisão se reportarem tanto ao racismo, quanto estamos presenciando desde o dia 25 de maio do corrente ano.
O que será que as emissoras de televisão querem dizer aos telespectadores/as com tantas reportagens sobre o racismo? Não existe racismo no Brasil? O racismo no Brasil estava silenciado? O debate sobre o racismo esta pautado na sociedade brasileira? O racismo está na agenda da grande imprensa? A sociedade brasileira resolveu admitir a existência do racismo e enfrenta-lo, ou tudo não passa de um jogo de cena?
Em meio ao bombardeio das reportagens, à primeira vista, a impressão que o/a telespectador/a tem é a de que não existe racismo no Brasil e os primeiros casos surgiram recentemente. Para os/as desavisados/as, desinteressados/as e desinformados/as no assunto, racismo não é coisa de negros/as, é coisa de brasileiros/as; se trata de um fenômeno social, tem história e está intrínseco a formação da sociedade brasileira que construiu seu patrimônio e riqueza econômica usando a inteligência, as mãos e os pés da gente negra; uma mão de obra especializada que desde o colonialismo até as vésperas da proclamação da República foi utilizada no trabalho da cultura da cana de açúcar, café, extração de metais preciosos, fundição de metais, confecção de utensílios domésticos e instrumentos de trabalho, manipulação de ervas, criação de gado, charqueadas e tantas outras atividades que foram indispensáveis a construção das riquezas do Brasil.
Portanto, o racismo faz parte da estrutura social brasileira, e se configura quando pessoas negras são excluídas da maioria das estruturas sociais e políticas, e as instituições agem na perspectiva que privilegiam os/as brancos/as e mantém suas vantagens em detrimento as vidas negras (KILOMBA, 2020, p.77).
Ainda que o racismo esteja intrínseco a história do Brasil, brasileiros/as nunca o enfrentara na perspectiva de superá-lo, poucos gostam de falar sobre tal assunto, outros dizem não existir e há quem acusem negros/as de inventá-lo. No geral tratam-no como caso de polícia e não como fenômeno social. Racismo não é coisa de negros/as, é coisa de brasileiros/as, tal fenômeno não começou esta semana e nem semana passada. É um fenômeno que acompanha brasileiros/as desde a invenção dessa terra como nação, e está na estrutura do Estado formado a partir de 1822, sobretudo, na sua forma de atuação, é invisível e sutil aos olhos dos indivíduos, mas destrutível no que diz respeito a mobilidade social dos sujeitos. Conforme nos ensinam Charles Hamilton e Kwame Ture,
É um dos modos pelo qual o Estado e as demais instituições estendem o seu poder sobre toda a sociedade. Esse é o racismo institucional e tem origem na operação de forças estabelecidas na sociedade e, portanto, recebe muitos menos condenação pública, porque é menos evidente, muito mais sútil, menos identificável em termos de indivíduos específicos que cometem os atos (HAMILTON & TURE Apud ALMEIDA, 2019, pp 43/44).
No Brasil esse fenômeno se solidificou e continuou aperfeiçoando-se mais especificamente em 1889 com a proclamação da República. Com a gente negra a um ano livre do trabalho escravizado, a republica passara a contar com os seguintes “problemas cruciais: a raça, a formação de uma nação, a cidadania, e a busca de um modelo civilizatório europeu” (SCHWARCZ, 1987, p. 33).
Nos acostumamos a sermos racistas, à medida que olhamos os espaços públicos e privados e consideramos normal o modo como eles estão socialmente ocupados. Precisamos a nos desacostumarmos e nos incomodarmos com o que é normal na sociedade brasileira.