Share Historinhas, Poesias e Contos
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By Lucio Maciel
The podcast currently has 7 episodes available.
Um Rato desejava atravessar um rio, mas o temia, pois não sabia nadar. Pediu ajuda a uma Rã que concordou desde que o Rato fosse amarrado a uma das patas. O Rato consentiu e encontrando um pedaço de fio, ligou uma de suas pernas à Rã. Assim que entraram no rio, porém, a Rã mergulhou, levando junto o Rato que sentia afogar-se. Por isso debatia-se com a Rã que, por sua vez, lutava para nadar; tudo isso causando muito cansaço e estardalhaços. Estavam nessa luta quando, por cima passava um Falcão que, percebendo o Rato sobre a água, baixou sobre ele e levou-o nas garras juntamente com a Rã que estava atada. Ainda no ar, os devorou.
Os Dois Viajantes na Macacolândia
Dois viajantes, transviados no sertão, depois de muito andar alcançam o reino dos macacos.
Ai deles! Guardas surgem na fronteira, guardas ferozes que os prendem, que os amarram e os levam à presença de S. Majestade Simão III.
El-rei examina-os detidamente, com macacal curiosidade, e em seguida os interroga:
— Que tal acham isto por aqui?
Um dos viajantes, diplomata de profissão, responde sem vacilar:
— Acho que este reino é a oitava maravilha do mundo. Sou viajadíssimo, já andei por Seca e Meca, mas, palavra de honra! nunca vi gente mais formosa, corte mais brilhante, nem rei de mais nobre porte do que Vossa Majestade.
Simão lambeu-se todo de contentamento e disse para os guardas:
— Soltem-no e dêem-lhe um palácio para morar e a mais gentil donzela para esposa. E lavrem incontinenti o decreto de sua nomeação para cavaleiro da mui augusta Ordem da Banana de Ouro.
Assim se fez e, enquanto o faziam, El-rei Simão, risonho ainda, dirigiu a palavra ao segundo viajante:
— E você? Que acha do meu reino?
Este segundo viajante era um homem neurastênico, azedo, amigo da verdade a todo o transe.
Tão amigo da verdade que replicou sem demora:
— O que acho? É boa! Acho o que é!…
— E que é que é? — interpelou Simão, fechando o sobrecenho.
— Não é nada. Uma macacalha… Macaco praqui, macaco prali, macaco no trono, macaco no pau…
— Pau nele — berra furioso o rei, gesticulando como um possesso. Pau de rachar nesse miserável caluniador…
E o viajante neurastênico, arrastado dali por cem munhecas, entrou numa roda de lenha que o deixou moído por uma semana.
Moral: Quem for amigo da verdade, use couraça ao lombo.
Monteiro Lobato.
Lamentava-se na gaiola um velho sabiá.
– Que triste destino o meu, nesta prisão toda a vida. E que saudades dos bons tempos de outrora, quando minha vida era um contínuo pular de galho em galho em procura das laranjas mais belas. Madrugador, quem primeiro saudava a luz da manhã era eu, como era eu o último a despedir-me do sol à tardinha, cantava e era feliz.
Um dia, traiçoeiro visgo me ligou os pés. Esvoacei, debati-me em vão e vim acabar nesta gaiola horrível, onde saudoso choro o tempo da liberdade. Que triste destino o meu! Haverá no mundo maior desgraça?
Nisto abre-se a porta da sala e entra o caçador, de espingarda ao ombro e uma fieira de pássaros na mão.
Ante o espetáculo das míseras avezinhas estraçalhadas a tiro, gotejantes de sangue, algumas ainda em agonia, o sabiá estremeceu e horripilado verificou não ser dos mais infelizes, pois que vivia e ainda não perder a esperança de recobrar a liberdade de outrora.
Refletiu sobre o caso e murmurou consigo:
– Antes penar que morrer.
Monteiro Lobato
Um gato de nome Faro-Fino deu de fazer tal destroço na rataria duma casa velha que os sobreviventes, sem ânimo de sair das tocas, estavam a ponto de morrer de fome.
Tornando-se muito sério o caso, resolveram reunir-se em assembléia para o estudo da questão. Aguardaram para isso certa noite em que Faro-Fino andava aos mios pelo telhado, fazendo sonetos à lua.
– Acho — disse um deles — que o meio de nos defendermos de Faro-Fino é lhe atarmos um guizo ao pescoço. Assim que ele se aproxime, o guizo o denuncia e pomo-nos ao fresco a tempo.
Palmas e bravos saudaram a luminosa idéia. O projeto foi aprovado com delírio. Só votou contra, um rato casmurro, que pediu a palavra e disse — Está tudo muito direito. Mas quem vai amarrar o guizo no pescoço de Faro-Fino?
Silêncio geral. Um desculpou-se por não saber dar nó. Outro, porque não era tolo. Todos, porque não tinham coragem. E a assembléia dissolveu-se no meio de geral consternação.
Dizer é fácil; fazer é que são elas!
Monteiro Lobato
Um velho galo matreiro, percebendo a aproximação da raposa, empoleirou-se numa árvore. A raposa, desapontada, murmurou consigo: “... Deixe estar, seu malandro, que já te curo!...” E em voz alta:
- Amigo, venho contar uma grande novidade: acabou-se a guerra entre os animais. Lobo e cordeiro, gavião e pinto, onça e veado, raposa e galinhas, todos os bichos andam agora aos beijos, como namorados. Desça desse poleiro e venha receber o meu abraço de paz e amor.
- Muito bem! – exclamou o galo. Não imagina como tal notícia me alegra! Que beleza vai ficar o mundo, limpo de guerras, crueldades e traições! Vou já descer para abraçar a amiga raposa, mas...como lá vem vindo três cachorros, acho bom esperá-los, para que também eles tomem parte na confraternização.
Ao ouvir falar em cachorros Dona Raposa não quis saber de histórias, e tratou de pôr-se ao fresco, dizendo:
- Infelizmente, amigo Co-ri-có-có, tenho pressa e não posso esperar pelos amigos cães. Fica para outra vez a festa, sim? Até logo.
E raspou-se.
Moral: Contra esperteza, - esperteza e meia.
Monteiro Lobato
Como a onça estivesse para casar-se, os animais todos andavam aos pulos, radiantes, com olho na festa prometida. Só uma velha rã sabidona torcia o nariz àquilo.
O marreco observou-lhe o trejeito e disse:
— Grande enjoada! Que cara feia é essa, quando todos nós pinoteamos alegres no antegozo do festão?
— Por um motivo muito simples — respondeu a rã. Porque nós, como vivemos quietas, a filosofar, sabemos muito da vida e enxergamos mais longe do que vocês. Responda-me a isto: se o sol se casasse e em vez de torrar o mundo sozinho o fizesse ajudado por dona sol e por mais vários sóis filhotes? Que aconteceria?
— Secavam-se todas as águas, está claro.
— Isto mesmo. Secavam-se as águas e nós, rãs e peixes, levaríamos a breca. Pois calamidade semelhante vai cair sobre vocês. Casa-se a onça, e já de começo será ela e mais o marido a perseguirem os animais. Depois aparecem as oncinhas — e os animais terão que agüentar com a fome de toda a família. Ora, se um só apetite já nos faz tanto mal, que será quando forem três, quatro e cinco?
O marreco refletiu e concordou:
— É isso mesmo…
Moral:
Monteiro Lobato
Perseguido pelos caçadores, um pobre veado escondeu-se bem quietinho dentro de cerrada moita. O abrigo era seguro, e tanto que por ele passaram os cães sem perceberem coisa nenhuma.
Salvou-se o veado; mas, ingrato e imprudente, logo que ouviu latir ao longe o perigo, esqueceu o benefício e pastou a benfeitora — comeu toda a folhagem que tão bem o escondera. Fez e pagou.
Dias depois voltaram novamente os caçadores. O veado correu em procura da moita — mas a pobre moita, sem folhas, reduzida a varas, não pôde mais escondê-lo, e o triste animalzinho acabou estraçalhado pelos dentes dos cães impiedosos.
Monteiro Lobato
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