Um dia,
de repente,
o gato deu vida a fantasia
de agir como gente,
começou a ficar de pé nas patas traseiras,
a gesticular com as dianteiras,
empinou-se num andar galante,
empossou-se dum gestual elegante;
aprendeu a se sentar na mesa,
a comer com garfo e faca na maior destreza,
a usar o toalete,
a limpar com guardanapo sua boca suja de croquete,
desimpressionou-se da luz a laser,
dos ratinhos de borracha
e até de sua bola,
passou a detestar o apelido de “Frajola”
em caçar não via mais beleza,
nunca mais comeu ração,
só queria saber de comida francesa;
aprendeu até mesmo a jogar xadrez e dominó
começou a trajar paletó,
às vezes colete,
gravata comprida,
às vezes borboleta,
monóculo,
cartola
bengala,
o felino, incrivelmente, aprendeu a falar,
e fazia sala
para as visitas,
que figura atraente,
com sua fala mansa e envolvente
era agradável demais,
bastante cortês
e muito sagaz
sabia contar piadas como ninguém,
dominava a arte do flerte cordial
e tinha sacadas geniais,
tratava os humanos na maior camaradagem,
só numa coisa permanecia selvagem,
dispensava cinto, suspensórios, todo tipo de alças
o bichano se recusava a usar calças,
detestava também usar calçados,
deixava todos avisados,
não era coisa para gato,
a moda de usar sapato,
tamanha cafonia,
ele até escreveu uma sinfonia
com um complicado arranjo de notas
deixou exposto
o seu repúdio ao mau gosto
do Gato de Botas
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