"A gente tá no topo de vários índices muito negativos, e quanto mais pobre, ou quanto mais negro, ou quanto mais você se encaixa no perfil das minorias sociais, mais risco você sofre. Então é um país que, pelo menos pra mim, é um país difícil de lidar assim. É tipo uma casa que você tá porque é a sua casa, mas é uma casa que você não é dali. É um não-lugar. Acho que tem isso. Ai pensar pro futuro, eu só consigo pensar que teria que começar de novo, porque já começou errado, né? A gente, tipo assim, a gente começou um país nasceu sob o genocídio dos povos indígenas, depois toda a economia sobre a mão de obra escravizada, de pessoas que foram trazidas de outro continente. (...) A Coalizão Negra por Direitos, que é uma organização da sociedade civil do movimento negro, diz que a gente precisaria de uma nova abolição da escravatura. Acho que a gente precisaria de uma nova independência assim. É um novo país assim de fato, porque... Eu não sei, por outro lado talvez seja pessimismo da minha parte, mas eu acho que a gente evoluiu muito pouco para ser um país melhor. A gente tem algumas conquistas, sei lá, hoje algumas pessoas negras conseguem entrar na faculdade, mas se você for comparar o todo são pouquíssimas pessoas, e essas pessoas elas continuam sendo muito mais mortas do que pessoas brancas, por exemplo, e as mulheres negras são muito mais mortas que as brancas. (...) Acho que é fazer um novo Brasil, é refundar mesmo. E é isso, refundar com quem deveria refundar mesmo, quem é dono. Não é dono no sentido de propriedade, "é meu", mas no sentido de quem cuida, de quem de fato valoriza e tem o país e a terra como elemento sagrado, que não pode ser destruído e nem pode estar à mercê do capital do lucro de meia dúzia de pessoas como que é hoje com essa riqueza concentrada".