Nesta obra ressoa a voz do "homem do subsolo", o personagem-narrador que, à força de paradoxos, investe ferozmente contra tudo e contra todos -contra a ciência e contra a superstição, contra o progresso e contra o atraso, contra a razão e na desrazão-; mas investe, acima de tudo, contra o solo da própria consciência, criando uma narrativa ímpar, de altíssima voltagem poética, que se afirma e se nega a si mesma sucessivamente. A novela é dividida em duas partes. Na primeira, "O subsolo", o anônimo narrador destila amargura e escárnio contra as almas idealistas de seu tempo, que confiam ingenuamente na subordinação do homem às leis da natureza como forma de atingir um estado de harmonia social e espiritual. Na segunda parte, "A propósito da neve molhada", a narrativa das peripécias do homem do subterrâneo leva da galhofa à tragédia. A negatividade do narrador revela seu lado sinistro quando enreda a prostituta Liza em sua teia: o espetáculo da auto-degradação se transforma em crueldade; os anátemas contra o humanismo deságuam no desespero e no remorso. ~Editora 34, 2000, 6a edição, 5a reimpressão, 2020, tradução: Boris Schnaidderman