“vida boa para aquele rapaz
de barba dourada
era morar na praia.
poder se virar pro azul claro das águas
sem nada interromper o olhar,
sonhar que, por um fluxo de imaginação,
ele chega ao continente africano.
dormir ouvindo o silêncio do mar
batendo as ondas na costa arenosa.
mirar o reflexo da lua
que flutua sem definição na superfície azul escuro da noite.
se deparar, de repente, com os presentes que netuno manda
sob a forma de conchinhas e seixos e cracas apegadas às pedras que escala.
comer o milho cozido com lasca de manteiga derretida
do vendedor ambulante que passa com a matraca.
vida boa para aquela moça
de cabelos platinados
era viver na serra.
com as divisas cantadas
circundadas por montes e montanhas imponentes.
criar vaca, bode, ovelha e galinha d’angola
e aprender a fazer pão caseiro e queijo branco.
escutar o silêncio profundo de uma folha roçando na outra
e os gemidos agudos do triscar do bambuzal.
sonhar com seres de uma perna só e com asas
que se divertem na solitude e brincam de travessuras.
arriscar o medo imaginário em queda livre
pelas águas transparentes que caem em verticalidade.
soltar neblinas, vapores e nevoeiros
que se comprimem no peito pelas narinas e boca.
enquanto, lá embaixo, o rapaz
observa a amplitude e profundidade marinha,
que se espalha pelo plano líquido,
a moça, lá em cima,
perscruta a imensidão e infinitude etérea celeste,
que transborda na claraboia arredondada.
nesse instante,
a luz e o brilho que irradiam dos olhos dos dois
se abraçam afestivamente na linha do horizonte”.