LANGDON, Jean. “A Viagem à Casa das Onças”: Narrativas sobre experiências extraordinárias.
Revista de Antropologia, São Paulo, USP, 2013, v. 56 no 2.
A performance das narrativas entre os índios Siona manifestam
a função estética, apontada por Richard Bauman e outros, por meio da
recriação da experiência das viagens xamânicas e da transformação de per-
spectiva que faz parte dos ritos com o uso do enteógeno yajé (ayahuasca).
Nestas viagens, a perspectiva cotidiana é substituída por uma outra, que
permite à plateia conhecer os seres que habitam o mundo invisível revelado
nas visões. Ademais, as performances têm o importante papel de transmitir
o conhecimento xamânico. A literatura oral dramatiza experiências de en-
contros ou viagens no mundo invisível, sejam estas ligadas ou não ao uso
de enteógenos e aos sonhos. Através dos mecanismos poéticos, essas narra-
tivas transmitem conhecimento ao indexar as relações entre o cotidiano e
as regiões ocultas. Assim, elas criam expectativas na plateia a respeito das
experiências extraordinárias com os espíritos e dão pistas de como entender
e preparar-se para a mudança de perspectiva que caracteriza os encontros
com o lado oculto. No intuito de explorar a relação entre a experiência ex-
traordinária, performance e perspectiva, este trabalho analisa uma narrativa
relatada por vários Siona sobre a época de sua juventude e aprendizagem
xamânica – “A viagem à Casa das Onças”. Nesta, o jovem é convidado pelo
mestre-xamã para visitar a casa das onças, onde elas aparecem na forma de
humanos, em festas onde elas convidam o jovem para descansar numa rede
nova, enquanto o mestre-xamã orienta o que o jovem está vendo. Esta via-
gem ao lado oculto não acontece durante o ritual sob a influência do yajé,
mas na manhã seguinte, quando o novato está de volta à aldeia. A análise
aponta para as estratégias que permitem à narrativa em performance criar
experiências, transmitindo conhecimento xamânico e informando sobre a
troca de perspectivas e o poder xamânico.