Ciência

África enfrenta nova variante de Mpox


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A Organização Mundial da Saúde declarou o surto de Mpox como uma emergência global, com casos confirmados em vários países de diferentes continentes e com uma nova variante em circulação. E esta nova variante preocupa os especialistas. Tudo indica que é mais perigosa e mais contagiosa. Walter Firmino, oficial de emergência dos escritórios da OMS em Angola, sublinha a mensagem de tranquilidade divulgada pela organização. 

RFI: A nova variante descoberta na República Democrática do Congo pode alterar os planos que estavam previstos até agora para conter a doença?

Walter Firmino: Sim, vai exigir que o país intensifique as actividades de vigilância epidemiológica, tanto nas áreas sanitárias como nas comunidades. Vai também intensificar a comunicação e o envolvimento com as comunidades para sensibilizar a população sobre os sintomas e formas de transmissão. Portanto, exige mais esforço no nosso sistema de saúde.

Como é que funciona a coordenação entre a OMS e os diferentes governos ? Como é feita essa ligação e comunicação? 

Quando foi declarada a emergência de importância internacional, a OMS activou o sistema de gestão de incidência que obriga os países a trocar informações. E também criou um dashboard, onde as pessoas ou os países podem ter acesso em tempo real a informações sobre a notificação de casos. É um sistema que ainda podemos melhorar. Muitos países não notificam em tempo real, mas existe um mecanismo de coordenação e de troca de informações no âmbito do Regulamento Sanitário Internacional.

Neste momento, África continua a ser o principal foco de preocupação.

Sim, é o principal foco. O Mpox já é endémico em África. Temos países como a República Democrática do Congo e outros na região. Mas a mutação, que é mais infecciosa e com transmissão fácil, passou as fronteiras do Congo e afectou outros países vizinhos. Alguns países que nunca notificaram casos estão agora a notificar, como o Burundi e a África do Sul. E há países que já tiveram casos há muito tempo e voltaram a notificar, como a Costa do Marfim.

Em relação à Europa, neste momento, a OMS envia mensagens de tranquilidade.

Porque é uma doença que não se transmite facilmente de forma rápida como uma infecção respiratória. É uma doença que se transmite por contacto. Pode ser por pessoas afectadas, que têm feridas e lesões na pele. Há uma nova forma de transmissão que é a via sexual. Mas mesmo assim, é uma doença que não provoca um número elevado de casos por dia, como outras doenças respiratórias. Quem tiver sintomas ou suspeita de Mpox deve detectar de forma precoce e fazer o rastreio dos contactos para controlar a progressão da doença a nível das comunidades.

Em relação ao contágio, têm surgido informações diferentes. No princípio, surgiu a informação de que o Mpox pode ser transmitido por secreções como gotículas de saliva ou respiratórias. As últimas informações falam de contacto físico próximo, incluindo o contacto sexual. É possível ter certezas em relação à forma de contágio?

O contágio cientificamente comprovado é por contacto com um doente com secreções que saem da ferida ou das lesões da pele e por via sexual. Também através do consumo da carne de macacos. Por via aérea ainda não está comprovado.

As pessoas têm acesso à informação sobre a doença? Como é que a comunidade está a reagir a esta nova variante?

No caso de Angola, onde estou neste momento, está a reagir normalmente e com tranquilidade. Criámos um plano de contingência para envolver as comunidades, dar informações correctas, explicar sintomas e também dizer o que podem ou devem fazer quando suspeitam que alguém tem sintomas.

Estudos apontam que a nova vacina contra a varíola humana é cerca de 85% eficaz na prevenção da doença. Como é que vai ser feita a gestão das vacinas? Quais são os grupos prioritários?

O Mpox está a ser transmitido com sintomas mais graves nas pessoas imunocomprometidas e nas crianças. Há poucas vacinas, estão a ser produzidas neste momento. Ser forem introduzidas em Angola, a população alvo será os profissionais de saúde e depois as pessoas imunocomprometidas porque desenvolvem a doença mais grave que pode levar à morte. O que dizemos agora à população é para não esperarem pela vacina e para terem comportamentos saudáveis para evitar o contágio. 

Na Europa, a vacina que pessoas com mais de 40 anos levaram quando eram crianças protege contra a doença?

A literatura ainda não diz nada sobre essa possibilidade. Há vacinas que deixam a memória ao longo tempo e há outras que a memória com o tempo vai passando. As informações científicas vão surgindo e essa questão vai ser esclarecida. A posição da OMS é manter a tranquilidade das populações e reforçar o sistema de vigilância, reforçar a comunicação nas comunidades, evitar o estigma e cuidar da doença psicológica ou doença mental.

A  Angola faz fronteira com a República Democrática do Congo, o país considerado o epicentro do Mpox e onde foi detectada a variante mais perigosa. Por essa razão, o Governo de Luanda reforçou o sistema de vigilância.

Angola reforçou o sistema de vigilância, elaborou um plano de contingência nacional e enviou esse plano às províncias da zona da fronteira com a RDC, que são cinco. As províncias replicaram esse plano de contingência e já se fez a formação dos técnicos da linha da frente da zona sanitária ao longo da fronteira. Há também actividades de envolvimento das comunidades nas províncias de Lunda Norte, Moxico, Lunda Sul, Malanje, Zaire e Uíge. São essas províncias que fazem fronteira com o Congo Democrático. Mas o país não ficou por aqui. Fez uma formação a nível nacional da equipa de resposta rápida que, por sua vez, vai fazer a formação a nível das províncias e municípios para termos uma equipa de destaque de resposta rápida, caso haja um caso para dar uma resposta atempada e evitar a expansão da doença.

Esta é a segunda vez em dois anos que o Mpox é considerado uma ameaça global. O que aprendemos em 2022? Estamos melhor preparados para enfrentar a doença?

A OMS deu as recomendações das boas práticas dos países afectados. Como sabem, estávamos a enfrentar a Covid19 e, por isso, houve actividades sobrepostas. Mas a abordagem é a mesma, as orientações são as mesmas e os países estão preparados para lidar com o Mpox. Porque não é uma doença emergente, não é uma doença nova e as medidas de transmissão e de prevenção são conhecidas.

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CiênciaBy RFI Português