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Exposição em Paris homenageia música de intervenção portuguesa


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A Casa de Portugal na Cidade Universitária de Paris, vai acolher, de 13 de Setembro a 31 de Outubro, uma exposição sobre a actividade musical dos exilados portugueses em França durante a ditadura do Estado Novo (1933-1974), em particular da geração que se opôs às guerras coloniais dos anos 60 e 70 em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. Neste programa, conversamos com Agnès Pellerin, uma das coordenadoras da exposição.

A exposição “Chansons de l’Exil Portugais à l’Aube de la Révolution des Œillets” vai ser inaugurada a 13 de Setembro e fica patente até 31 de Outubro na Maison du Portugal-André de Gouveia, na Cité Universitaire Internationale de Paris. A mostra junta 13 painéis com cerca de cinquenta ilustrações, nomeadamente capas de discos, panfletos, fotografias, e é acompanhada por um guia que permite ouvir online alguns excertos sonoros com traduções em francês. Através da música, é apresentado o percurso de várias figuras da música de intervenção portuguesa que se exilaram em Paris, como José Mário Branco, Luís Cília, Tino Flores, Sérgio Godinho, Francisco Fanhais, que nas suas canções denunciam a ditadura, a pobreza em Portugal e a guerra colonial.

“Esta exposição em francês é uma exposição documental que retoma elementos de uma exposição que já foi feita no âmbito do Observatório da Canção de Protesto, em Grândola, em 2020. É uma adaptação, tradução e inclui também novos elementos para atingir um público que não seja especialista e conhecedor da música portuguesa, nem lusófono. Também envolve excertos de canções online com traduções em francês. A ideia deste trabalho sobre música e exílio é interrogar os percursos dos músicos, a dimensão biográfica, mas também interrogar as narrativas individuais à luz das ligações deles com as culturas do país de acolhimento, incluindo as de outras comunidades exiladas. Os portugueses em França encontraram cá nos anos 1960, 1970, espanhóis que estavam a fugir do franquismo, depois gregos, chilenos, brasileiros”, conta à RFI Agnès Pellerin, investigadora em estudos culturais e uma das coordenadoras da exposição.

Em França, o contexto é radicalmente diferente. Para começar, há liberdade de gravação, de criação e de difusão de canções de protesto que seriam imediatamente censuradas em Portugal e que denunciam abertamente as guerras coloniais, como, por exemplo, “A Bola” de Luís Cília, “Deserção” de Tino Flores, “Ronda do Soldadinho” de José Mário Branco. Criticam, ainda, a repressão, as prisões e a polícia política da ditadura, como “Vampiros” de José Afonso, “Queixa das almas jovens censuradas” e “Perfilados de Medo” de José Mário Branco e “Porque de Francisco Fanhais. Outras canções falam sobre a emigração, os seus sonhos e as suas desilusões, como “Por Terras de França” de José Mário Branco, “Cantar de emigração” de Adriano Correia de Oliveira ou “Que força é essa, amigo” de Sérgio Godinho e recentemente adaptada por Capicua.

O vento revolucionário de Maio de 68 também agita os exilados portugueses, muitos dos quais ocupam, por exemplo, a Casa de Portugal e se inspiram para criar canções como “Les Mille et Une Nuits” de Sérgio Godinho. Depois, é a própria “chanson française”, na forma e no conteúdo, que contaminam os músicos portugueses, como Luís Cília, apadrinhado por Georges Brassens e que viria a gravar, mais tarde, um tema de Brassens adaptado por ele, “A Má Reputação”.

Incontornável é a história mais conhecida da gravação, em 1971, da música que é o emblema da "Revolução dos Cravos", “Grândola Vila Morena”. Uma das fotografias centrais da exposição evoca justamente essa altura, com Francisco Fanhais, José Afonso e José Mário Branco de braço dado, no Château d’Hérouville, nos arredores de Paris.

Ainda que haja um foco na criação musical dos anos 60 e 70, a exposição também aborda o percurso de Fernando Lopes-Graça. É que, em Maio de 1937, fugindo à repressão política do Estado Novo, Fernando Lopes-Graça instalou-se em Paris, onde se manteve até à eclosão da 2ª Guerra Mundial.

“Fernando Lopes-Graça é uma figura muito importante na música portuguesa mais erudita e também da militância ao lado do Partido Comunista Português clandestino. Ele foi também uma fonte de inspiração muito importante para os cantores dos anos 60 e 70. Também era muito importante dar a ouvir músicas diferentes e estarmos atentos a vários estilos musicais. Por exemplo, a exposição também trata de fado que era algo polémico dentro da geração de 60 e, sobretudo, 70, mas também fala do folclore”, acrescenta Agnès Pellerin.

A exposição propõe uma abordagem inclusiva em termos musicais, mas também quer devolver a esta história a presença de mulheres, nomeadamente as autoras de letras, poetisas como Natália Correia e Sophia de Mello Breyner, mas também há uma alusão à cantora francesa de origem portuguesa Catherine Ribeiro.

Na exposição vai haver, também, projecções de filmes, conferências e encontros. Na inauguração, a 13 de Setembro, é apresentado “O Salto”, de Christian de Chalonge, de 1967, o primeiro filme de ficção realizado sobre a imigração portuguesa em França e em que a música foi composta por Luís Cília.

A 20 de Setembro,  dois cantores da geração de Abril, Francisco Fanhais e Manuel Freire, vão cantar e conversar com os musicólogos Hugo Castro e Ricardo Andrade. Recorde-se que Francisco Fanhais esteve, em 1971, com José Afonso, José Mário Branco e Carlos Correia no Château d’Hérouville, nos arredores de Paris, a gravar “Grândola Vila Morena”.

A 5 de Outubro, a Associação Memória Viva promove um debate em torno da música nos filmes que abordam a imigração portuguesa em França nos anos 60 e 70. A 9 de Outubro, o musicólogo Manuel Deniz Silva vai conversar com a historiadora Cristina Clímaco sobre o exílio, em Paris, do músico Fernando Lopes-Graça nos anos 1930. Também se pretende receber visitas de estudo.

A exposição acontece no âmbito do projecto EXIMUS – Música e Exílio, do INET-md, uma unidade de investigação em música e dança na Universidade Nova de Lisboa, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Esta é uma parceria com a Maison du Portugal – André de Gouveia e a Associação Memória Viva. 

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