Nesse podcast, vou abordar um tema que, para muitos de meus ouvintes é uma caixa preta, sendo considerada como uma obrigação do pesquisador mais experiente e, também, um skillaprendido, que não se encontra detalhado em manuais. Uma busca no youtubetraz vários vídeos explanatórios que não ensinam realmente as sutilezas inerentes ao processo.
É a famosa revisão por pares ou, em inglês, peer review. Por exemplo como fazer a revisão de projetos de pesquisa, de teses, de monografias, de manuscritos a submeter e quais as diferenças mais importantes entre todos eles? Como se relacionar com os jornais que solicitam a sua revisão como par? Como avaliar se tenho o conhecimento necessário para efetuar essa revisão se nem sequer tenho acesso prévio ao manuscrito? Como avaliar possíveis conflitos de interesse, caso conheça o pesquisador, seja um colaborador eventual dele ou atue em uma linha de pesquisa muito similar a dele? Como proceder ao avaliar um manuscrito ou tese de qualidade duvidosa ou necessitando de um trabalho intensivo de melhoria?
Bom, começo aqui por informar que você não está só. Essa é uma questão generalizada no mundo acadêmico e tem sido alvo de muitos artigos e editoriais que discutem a busca de aperfeiçoar esse sistema, torná-lo mais justo e equitativo, aumentar a diversidade dos revisores, tornar os critérios de avaliação mais padronizados, e até, eventualmente, tornar o processo pago.
Um editorial de junho de 2022 (https://www.insidehighered.com/news/2022/06/13/peer-review-crisis-creates-problems-journals-and-scholars) aponta para uma questão premente: o esgotamento do sistema e dos pesquisadores que regularmente contribuem para as revistas na qualidade de revisores, um problema agravado pela pandemia e o extraordinário crescimento de artigos a publicar em certas áreas de atuação, notadamente nas ciências da saúde. Um dos resultados mais visíveis é o atraso no processo de publicação dos artigos, o que representa uma perda importante de divulgação de novo conhecimento de qualidade para a sociedade. De fato, um artigo publicado em março de 2022 pelo grupo de David Moher, mostra que uma minoria, composta primordialmente por homens localizados na Europa e na Ásia, revisavam mais de 100 manuscritos por ano, contrastando com o grupo controle, onde 2/3 eram homens, europeus e norte-americanos (ver comentário em https://revistapesquisa.fapesp.br/o-enigma-dos-revisores-muito-produtivos/) que revisavam no máximo 12 artigos/ano. Chama a atenção o número de manuscritos revisados, em média 1 a cada 3 ou 4 dias: Será que a qualidade dessas revisões é boa? Outro editorial, desta vez na Nature Reviews Nephrology de maio de 2022 (https://www.nature.com/articles/s41581-022-00569-w) reforça a importância deste processo dentro da lista de tarefas efetuadas para cada manuscrito submetido e informa que que o sistema de submissão agora permite que o revisor se identifique e registre a sua atividade na base de dados ORCID, em retribuição ao esforço e tempo demandado no desempenho desta tarefa. Aliás, vale a pena consultar a extensa lista de checagem de cada manuscrito submetido, do grupo Nature (https://www.nature.com/nrneph/editorial-input-and-checks), da qual a revisão por pares é uma das muitas etapas do processo. Interessante notar que é muito apreciada e estimulada a mentoria e supervisão de jovens pesquisadores, buscando formar a próxima geração de bons revisores.