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Como estão as meninas e mulheres em Moçambique, num país que é muitas vezes apontado como exemplo de participação política e governativa da mulher? Até que ponto os direitos e liberdades delas são respeitados? Estará Moçambique preparado para, um dia, ter uma mulher Presidente da República? A activista social Angelina Magibire diz que ainda não e faz-nos uma "radiografia" da situação das mulheres jovens no país.
A nossa convidada é Angelina Magibire, coordenadora do pilar de litigação e regulação no Observatório Cidadão para Saúde e activista social dedicada à promoção dos direitos das mulheres jovens no Movimento Jovens Feministas de Moçambique e no colectivo Nós na Diversidade.
RFI: Em termos demográficos, qual é a percentagem de mulheres e meninas em Moçambique?
Angelina Magibire, activista social: O último censo que nós temos, eu não tenho uma taxa exacta, mas nós temos mais mulheres jovens em Moçambique em relação aos homens. Se não estou em erro, são 51% de mulheres jovens.
E, em termos de eleitorado, tem noção do que representam as mulheres?
Em termos de percentagem não, mas posso assumir com 100% de certeza que as mulheres são a maioria.
Como é que está a situação dos direitos das mulheres e das meninas em Moçambique?
Em termos de legislação, temos uma legislação muito boa. Temos a lei que permite o aborto, temos o Protocolo de Maputo, temos várias assinaturas de algumas legislações internacionais que Moçambique ratificou para proteger aquilo que são os direitos humanos das mulheres jovens, pese embora que no seu dia-a-dia ainda temos um problema que é a sua efectivação.
Podemos dar o exemplo que nos últimos tempos temos acompanhado uma crescente onda de desaparecimento de mulheres jovens, algumas já aparecem mortas. Então, em termos de segurança, ainda não existe uma certa segurança para as mulheres jovens e nós olhamos essa situação que está sendo tratado como uma negligência porque assumimos que existe, sim, uma onda crescente de violência contra as mulheres jovens, que algumas até desaparecem e nem chegam a aparecer e outras aparecem já sem vida.
Falou em aumento. Temos números e percentagens de feminicídios, por exemplo?
Um outro desafio é esse porque não são tornadas públicas algumas das percentagens de quantas mulheres desaparecem por ano e quantas foram vítimas de feminicídio em Moçambique. Ainda não exista essa figura de feminicídio, olhamos como homicídio, não há essa discriminação de género homem e mulher.
Mas o que temos acompanhado nos últimos tempos nas redes sociais, nas plataformas digitais e também nos jornais, temos visto essa onda crescente do desaparecimento de algumas mulheres jovens e também alguns actos macabros. Vou dar o exemplo que aconteceu ainda este ano de uma mulher que foi assassinada pelo seu marido e o corpo dela foi deitado numa lixeira pública e a família ficou a procurar durante um tempo. Encontrou-se e descobriu-se que quem matou foi o seu marido, mas ele depois de ouvido foi solto. Só depois de muitas acções que várias organizações da sociedade civil tiveram é que ele foi recolhido às celas. Este episódio também mostra aquilo que é a negligência nestes casos. Como é que alguém que é culpado de homicídio, que é confesso, depois de algum tempo é restituído à liberdade?
Olhando também como ocorreu tal crime, foi um crime brutal. Ele, depois de agredir a sua esposa, teve a coragem de levar o corpo dela e deitar numa lixeira pública. Então, estavam reunidos vários agravantes e mesmo assim ele foi restituído à liberdade. Isso também é uma situação que mostra que existe uma fragilidade naquilo que é o protocolo para defender os direitos humanos das mulheres jovens.
Porque é que há um aumento da violência e feminicídios? Há uma noção?
Noção assim não temos, mas pode-se dever àquilo que é a fragilidade das mulheres jovens perante os seus agressores. Quando eu digo aumento é aumento mediático, pode ser que os casos antigamente não estivessem a ser reportados, mas ultimamente temos visto também essa liberdade que as plataformas digitais nos dão de poder acompanhar algumas situações em tempo real. Também temos noção que existem casos que estão a ocorrer, que não nos são reportados, que não chegam até nós e são abafados a nível de algumas comunidades, a nível de algumas famílias.
É mais difícil ser mulher em Moçambique do que ser homem?
Basicamente eu posso dizer que sim, olhando também para o senso comum que nós temos e também olhando para as comunidades e para as colaborações que nós temos feito como organizações que trabalham com mulheres jovens.
É mais difícil ser mulher em relação ao homem por causa da questão do assédio. Posto isto, assédio também é uma questão muito frágil porque é difícil de reportar porque se for um assédio que ainda não se efectivou numa relação carnal, podemos dizer que é muito difícil reportar porque é a minha palavra contra a palavra do meu superior, por hipótese. E os meus colegas, muitas das vezes, não têm aquela sensibilidade de testemunhar a favor porque também temem que sofram represálias. Também essa questão do assédio é muito difícil porque também não pode se filmar ou não se pode gravar a outra pessoa sem autorização. Então, não posso usar vídeos, não posso usar gravações a meu favor como meu testemunho porque sem autorização aquilo não é válido.
Trabalha na organização da sociedade civil Observatório Cidadão para Saúde. Como é que está a situação das mulheres em termos de saúde, por exemplo, no que toca à mutilação genital feminina, ao acesso a cuidados de saúde sexual e reprodutiva, à interrupção voluntária da gravidez?
Em termos de mutilação genital, acredito que Moçambique pode comemorar porque ultimamente não temos ouvido falar desses casos. Em termos de acesso à interrupção voluntária da gravidez, ainda existe um certo tabu porque algumas raparigas preferem fazer ao nível das suas comunidades devido a uma vasta gama de protocolos que têm que seguir porque, muitas das vezes, algumas querem sigilo. Você vai até o posto médico mesmo sabendo que é gratuito, mas existe uma série de protocolos que tem que seguir, tem que ter algumas autorizações, tem que ter também alguns documentos a suportar aquilo que é o seu pedido.
Muitas das vezes, elas vêem este método como burocrático e preferem fazer a interrupção fora. Outros casos que nós temos acompanhado também, e existem algumas organizações que trabalham com isso, é a questão da violência obstétrica que, ultimamente, também temos ouvido bastante e temos ouvido de forma gritante por causa mesmo das plataformas digitais que nos dão essa facilidade de ter acesso a algumas informações que algumas mulheres jovens reportam sobre esta violência que têm sofrido a nível das unidades sanitárias.
As mulheres, apesar de serem a maioria da população, são quem sofre mais discriminação e é sobre elas que a pobreza mais incide em Moçambique. Porquê?
Muitas das vezes porque também tem muitas mulheres que trabalham no mercado informal porque o mercado informal é composto maioritariamente por mulheres jovens. O que nós temos acompanhado a nível das zonas urbanas é que existe uma falsa sensação de que existem mulheres a ocuparem lugares de destaque em lugares de direcção, mas quando já nos vamos afastando para zonas mais suburbanas, encontramos uma realidade totalmente diferente porque as mulheres não estão em mesmo pé de igualdade com os homens, muitas das vezes aliado a questões domésticas, às questões culturais porque a mulher é tida como a pessoa que tem que fazer os deveres de casa.
Se os homens naturalmente acordam e podem-se preparar para sair e ir à escola, a mulher tem que acordar, lavar a loiça, preparar não sei o quê, arrumar a casa. Não podemos falar de igualdade se o ponto de partida é desigual. Muitas das vezes isso afecta de forma directa naquilo que é o desempenho da mulher fora de casa porque algumas são obrigadas a desistir da escola, muitas das vezes por causa da gravidez na adolescência, para depois cuidar da criança. Algumas também são vítimas de alguns abusos, outras são vítimas do abandono do próprio marido que as abandonam grávidas. Então, para elas poderem se sustentar e se manter, abandonam as escolas e começam a fazer negócio informal ou metem-se em outras actividades. E isso também tem um impacto directo naquilo que seria a sua vida, a sua carreira no futuro.
Em conversa com homens em Maputo, disseram-me que em Moçambique o poder do homem estava relacionado com o número de mulheres que tinha e que era normal que no interior do país as meninas tivessem filhos a partir dos 13 anos e que as mulheres tivessem vários filhos, como se fosse para isso que as mulheres existissem, para se ocuparem do marido e ter muitos filhos. Como é que responde a isto enquanto mulher moçambicana?
Isso é um problema cultural porque já está enraizado. As mulheres acreditam que realmente foram feitas para isso porque elas estão a sair de um quadro que olham as outras mulheres como exemplo. Se a minha mãe saiu de uma realidade assim, eu também vou seguir a mesma realidade. Nem todas têm o poder de questionar, nem todas têm esse poder crítico, então acabam seguindo a mesma linhagem das outras mulheres que elas têm como exemplo. Mas isto deve-se mais a questões culturais e também ao fraco poder de compra porque, muitas das vezes, as mulheres trabalham dentro de casa e os homens é que têm esse poder de suprir o mundo das necessidades económicas e este poder de compra é que compromete o poder de decisão das mulheres.
O CIP, Centro de Integridade Pública, tinha apontado que Moçambique é um dos países com mais representatividade da mulher em órgãos de tomada de decisão e que, em Março de 2022, o país atingiu a paridade de género no governo, tornando-se num dos 14 países do mundo com esse nível e o terceiro em África a ter 50% ou mais de mulheres em cargos ministeriais. Confirma? As mulheres estão mesmo em destaque na política em Moçambique? E se assim é, porque é que nunca tivemos, por exemplo, uma mulher Presidente da República?
Eu confirmo porque são metas a serem cumpridas porque existem alguns protocolos que Moçambique ratificou que era de atingirmos a paridade daquilo que é a representação a nível da política em Moçambique. Em termos de representatividade a nível do Governo, Moçambique está muito bom. Olhando para a radiografia de Moçambique, está muito bom, mas podia melhorar em alguns aspectos. Acredito que termos uma Presidente mulher ainda é um desafio, mas do jeito que as coisas estão hoje, já não é o que aconteceu nas primeiras eleições gerais ou nas segundas eleições gerais. Acredito que num futuro breve talvez possamos ter uma mulher Presidente porque se houve essa abertura para colocar mais mulheres a tomarem cargos de decisão, cargos de direcção a nível de Moçambique, acredito que sim, que em algum momento podemos ter uma mulher Presidente.
Moçambique está preparado para ter uma mulher Presidente?
Não, não acredito que esteja. É um desafio, mas estamos confiantes que algum dia consigamos chegar lá. Olho não como alguém que está numa organização feminista, olho mesmo como uma pessoa da sociedade porque ainda há uma certa resistência de algumas pessoas receberem ordens de uma mulher Presidente. Então, é mais fácil colocar a mulher como presidente da Assembleia da República porque na ausência do Presidente da República, quem responde é a presidente da Assembleia da República. Então, nestes níveis acredito que também é um ganho e um avanço.
Como estão as meninas e mulheres em Moçambique, num país que é muitas vezes apontado como exemplo de participação política e governativa da mulher? Até que ponto os direitos e liberdades delas são respeitados? Estará Moçambique preparado para, um dia, ter uma mulher Presidente da República? A activista social Angelina Magibire diz que ainda não e faz-nos uma "radiografia" da situação das mulheres jovens no país.
A nossa convidada é Angelina Magibire, coordenadora do pilar de litigação e regulação no Observatório Cidadão para Saúde e activista social dedicada à promoção dos direitos das mulheres jovens no Movimento Jovens Feministas de Moçambique e no colectivo Nós na Diversidade.
RFI: Em termos demográficos, qual é a percentagem de mulheres e meninas em Moçambique?
Angelina Magibire, activista social: O último censo que nós temos, eu não tenho uma taxa exacta, mas nós temos mais mulheres jovens em Moçambique em relação aos homens. Se não estou em erro, são 51% de mulheres jovens.
E, em termos de eleitorado, tem noção do que representam as mulheres?
Em termos de percentagem não, mas posso assumir com 100% de certeza que as mulheres são a maioria.
Como é que está a situação dos direitos das mulheres e das meninas em Moçambique?
Em termos de legislação, temos uma legislação muito boa. Temos a lei que permite o aborto, temos o Protocolo de Maputo, temos várias assinaturas de algumas legislações internacionais que Moçambique ratificou para proteger aquilo que são os direitos humanos das mulheres jovens, pese embora que no seu dia-a-dia ainda temos um problema que é a sua efectivação.
Podemos dar o exemplo que nos últimos tempos temos acompanhado uma crescente onda de desaparecimento de mulheres jovens, algumas já aparecem mortas. Então, em termos de segurança, ainda não existe uma certa segurança para as mulheres jovens e nós olhamos essa situação que está sendo tratado como uma negligência porque assumimos que existe, sim, uma onda crescente de violência contra as mulheres jovens, que algumas até desaparecem e nem chegam a aparecer e outras aparecem já sem vida.
Falou em aumento. Temos números e percentagens de feminicídios, por exemplo?
Um outro desafio é esse porque não são tornadas públicas algumas das percentagens de quantas mulheres desaparecem por ano e quantas foram vítimas de feminicídio em Moçambique. Ainda não exista essa figura de feminicídio, olhamos como homicídio, não há essa discriminação de género homem e mulher.
Mas o que temos acompanhado nos últimos tempos nas redes sociais, nas plataformas digitais e também nos jornais, temos visto essa onda crescente do desaparecimento de algumas mulheres jovens e também alguns actos macabros. Vou dar o exemplo que aconteceu ainda este ano de uma mulher que foi assassinada pelo seu marido e o corpo dela foi deitado numa lixeira pública e a família ficou a procurar durante um tempo. Encontrou-se e descobriu-se que quem matou foi o seu marido, mas ele depois de ouvido foi solto. Só depois de muitas acções que várias organizações da sociedade civil tiveram é que ele foi recolhido às celas. Este episódio também mostra aquilo que é a negligência nestes casos. Como é que alguém que é culpado de homicídio, que é confesso, depois de algum tempo é restituído à liberdade?
Olhando também como ocorreu tal crime, foi um crime brutal. Ele, depois de agredir a sua esposa, teve a coragem de levar o corpo dela e deitar numa lixeira pública. Então, estavam reunidos vários agravantes e mesmo assim ele foi restituído à liberdade. Isso também é uma situação que mostra que existe uma fragilidade naquilo que é o protocolo para defender os direitos humanos das mulheres jovens.
Porque é que há um aumento da violência e feminicídios? Há uma noção?
Noção assim não temos, mas pode-se dever àquilo que é a fragilidade das mulheres jovens perante os seus agressores. Quando eu digo aumento é aumento mediático, pode ser que os casos antigamente não estivessem a ser reportados, mas ultimamente temos visto também essa liberdade que as plataformas digitais nos dão de poder acompanhar algumas situações em tempo real. Também temos noção que existem casos que estão a ocorrer, que não nos são reportados, que não chegam até nós e são abafados a nível de algumas comunidades, a nível de algumas famílias.
É mais difícil ser mulher em Moçambique do que ser homem?
Basicamente eu posso dizer que sim, olhando também para o senso comum que nós temos e também olhando para as comunidades e para as colaborações que nós temos feito como organizações que trabalham com mulheres jovens.
É mais difícil ser mulher em relação ao homem por causa da questão do assédio. Posto isto, assédio também é uma questão muito frágil porque é difícil de reportar porque se for um assédio que ainda não se efectivou numa relação carnal, podemos dizer que é muito difícil reportar porque é a minha palavra contra a palavra do meu superior, por hipótese. E os meus colegas, muitas das vezes, não têm aquela sensibilidade de testemunhar a favor porque também temem que sofram represálias. Também essa questão do assédio é muito difícil porque também não pode se filmar ou não se pode gravar a outra pessoa sem autorização. Então, não posso usar vídeos, não posso usar gravações a meu favor como meu testemunho porque sem autorização aquilo não é válido.
Trabalha na organização da sociedade civil Observatório Cidadão para Saúde. Como é que está a situação das mulheres em termos de saúde, por exemplo, no que toca à mutilação genital feminina, ao acesso a cuidados de saúde sexual e reprodutiva, à interrupção voluntária da gravidez?
Em termos de mutilação genital, acredito que Moçambique pode comemorar porque ultimamente não temos ouvido falar desses casos. Em termos de acesso à interrupção voluntária da gravidez, ainda existe um certo tabu porque algumas raparigas preferem fazer ao nível das suas comunidades devido a uma vasta gama de protocolos que têm que seguir porque, muitas das vezes, algumas querem sigilo. Você vai até o posto médico mesmo sabendo que é gratuito, mas existe uma série de protocolos que tem que seguir, tem que ter algumas autorizações, tem que ter também alguns documentos a suportar aquilo que é o seu pedido.
Muitas das vezes, elas vêem este método como burocrático e preferem fazer a interrupção fora. Outros casos que nós temos acompanhado também, e existem algumas organizações que trabalham com isso, é a questão da violência obstétrica que, ultimamente, também temos ouvido bastante e temos ouvido de forma gritante por causa mesmo das plataformas digitais que nos dão essa facilidade de ter acesso a algumas informações que algumas mulheres jovens reportam sobre esta violência que têm sofrido a nível das unidades sanitárias.
As mulheres, apesar de serem a maioria da população, são quem sofre mais discriminação e é sobre elas que a pobreza mais incide em Moçambique. Porquê?
Muitas das vezes porque também tem muitas mulheres que trabalham no mercado informal porque o mercado informal é composto maioritariamente por mulheres jovens. O que nós temos acompanhado a nível das zonas urbanas é que existe uma falsa sensação de que existem mulheres a ocuparem lugares de destaque em lugares de direcção, mas quando já nos vamos afastando para zonas mais suburbanas, encontramos uma realidade totalmente diferente porque as mulheres não estão em mesmo pé de igualdade com os homens, muitas das vezes aliado a questões domésticas, às questões culturais porque a mulher é tida como a pessoa que tem que fazer os deveres de casa.
Se os homens naturalmente acordam e podem-se preparar para sair e ir à escola, a mulher tem que acordar, lavar a loiça, preparar não sei o quê, arrumar a casa. Não podemos falar de igualdade se o ponto de partida é desigual. Muitas das vezes isso afecta de forma directa naquilo que é o desempenho da mulher fora de casa porque algumas são obrigadas a desistir da escola, muitas das vezes por causa da gravidez na adolescência, para depois cuidar da criança. Algumas também são vítimas de alguns abusos, outras são vítimas do abandono do próprio marido que as abandonam grávidas. Então, para elas poderem se sustentar e se manter, abandonam as escolas e começam a fazer negócio informal ou metem-se em outras actividades. E isso também tem um impacto directo naquilo que seria a sua vida, a sua carreira no futuro.
Em conversa com homens em Maputo, disseram-me que em Moçambique o poder do homem estava relacionado com o número de mulheres que tinha e que era normal que no interior do país as meninas tivessem filhos a partir dos 13 anos e que as mulheres tivessem vários filhos, como se fosse para isso que as mulheres existissem, para se ocuparem do marido e ter muitos filhos. Como é que responde a isto enquanto mulher moçambicana?
Isso é um problema cultural porque já está enraizado. As mulheres acreditam que realmente foram feitas para isso porque elas estão a sair de um quadro que olham as outras mulheres como exemplo. Se a minha mãe saiu de uma realidade assim, eu também vou seguir a mesma realidade. Nem todas têm o poder de questionar, nem todas têm esse poder crítico, então acabam seguindo a mesma linhagem das outras mulheres que elas têm como exemplo. Mas isto deve-se mais a questões culturais e também ao fraco poder de compra porque, muitas das vezes, as mulheres trabalham dentro de casa e os homens é que têm esse poder de suprir o mundo das necessidades económicas e este poder de compra é que compromete o poder de decisão das mulheres.
O CIP, Centro de Integridade Pública, tinha apontado que Moçambique é um dos países com mais representatividade da mulher em órgãos de tomada de decisão e que, em Março de 2022, o país atingiu a paridade de género no governo, tornando-se num dos 14 países do mundo com esse nível e o terceiro em África a ter 50% ou mais de mulheres em cargos ministeriais. Confirma? As mulheres estão mesmo em destaque na política em Moçambique? E se assim é, porque é que nunca tivemos, por exemplo, uma mulher Presidente da República?
Eu confirmo porque são metas a serem cumpridas porque existem alguns protocolos que Moçambique ratificou que era de atingirmos a paridade daquilo que é a representação a nível da política em Moçambique. Em termos de representatividade a nível do Governo, Moçambique está muito bom. Olhando para a radiografia de Moçambique, está muito bom, mas podia melhorar em alguns aspectos. Acredito que termos uma Presidente mulher ainda é um desafio, mas do jeito que as coisas estão hoje, já não é o que aconteceu nas primeiras eleições gerais ou nas segundas eleições gerais. Acredito que num futuro breve talvez possamos ter uma mulher Presidente porque se houve essa abertura para colocar mais mulheres a tomarem cargos de decisão, cargos de direcção a nível de Moçambique, acredito que sim, que em algum momento podemos ter uma mulher Presidente.
Moçambique está preparado para ter uma mulher Presidente?
Não, não acredito que esteja. É um desafio, mas estamos confiantes que algum dia consigamos chegar lá. Olho não como alguém que está numa organização feminista, olho mesmo como uma pessoa da sociedade porque ainda há uma certa resistência de algumas pessoas receberem ordens de uma mulher Presidente. Então, é mais fácil colocar a mulher como presidente da Assembleia da República porque na ausência do Presidente da República, quem responde é a presidente da Assembleia da República. Então, nestes níveis acredito que também é um ganho e um avanço.
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