Share Felipe Simão - Poesias
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Essa foi a minha primeira noite sem pesadelos, em dois meses;
a vida urbana por si só já é um risco de morte,
a vida familiar é um emaranhado de intrigas sem solução
dia após dia perigas na beira do abismo
e nessa desventura,
matura a ideia de que os idealismos são sem razão
Hoje é 16 de fevereiro,
sexta feira,
2024,
e a única coisa que desejo,
no fundo do meu peito,
é paz
Para dizer a verdade,
percebo que esse caminho de linhas tortas
não me levou a lugar nenhum,
longe ou perto dos meus sonhos,
continuo distante da realização,
o caminho em si não me ensinou nenhuma lição
Faz um ano que cheguei;
a mulher por quem me apaixonei
não é mais a mesma,
Ipanema perdeu o vislumbre;
a Lagoa
a praia,
o morro Dois Irmãos,
são retoques de uma lembrança
que exige novas demãos
para não esmorecer com o tempo,
como uma pintura em afresco;
a clausura do apartamento já não parece desperdício,
as aves exóticas já não me inspiram mais que os
as amendoeiras têm menos encanto que as casuarinas;
a minha terra é feia,
mas lá ainda é permitido se olhar nos olhos;
eu sigo aqui,
de pupilas perdidas,
ando pelas ruas sem me encantar,
observando tudo com a pachorrência cotidiana
que percorria as vias esburacadas de Santo Amaro;
vendedores e pedintes já não me abordam,
sequer me notam;
talvez tudo esteja a mesma coisa,
eu é que mudei,
Ipanema me ensinou a admirar exibindo a sua beleza
Não sei se me entrego
ou se só aceito o mau gosto da sorte,
a caminhos predefinidos não me apego,
expectativas não rego,
ando sem um norte,
uma bússola é tão inútil quanto a prudência,
o quão fútil é a aparência;
meu horizonte é traçado por linhas tortas,
vejo meras tábuas de madeira
que todos insistem em chamar de portas,
todo esse grande valor,
a propaganda dum predial esplendor,
são ideologias de paisagem,
acho tudo uma grande bobagem,
oportunidades não te encerram num cubo;
eu apenas me masturbo,
pois não faço sexo sem amor;
as verdadeiras chances são aquelas que a gente se nega a
são os sonhos que a gente se priva de ter,
o lúdico não é digno,
a arte não é labor,
o tédio é fidedigno
e por isso tem valor,
então a gente rasga o poema
e se condena
Quando eu me tornei escritor,
as palavras foram perdendo o valor
Eu percebi que as palavras são como
só são eternas no papel.
Quando eu me tornei ator,
notei que o que as pessoas me
não tem tanta importância,
a gente se treina a agir de
Quando eu me tornei comediante,
cheguei à conclusão
de que o maior erro que se pode cometer é levar a vida a sério demais.
O mais estranho
é que agora que estou quase me tornando uma pessoa,
o sentido se inverteu
no início dessa jornada,
eu queria conseguir dizer o que sentia,
hoje eu sinto que nunca precisei dizer nada.
Sentado no cais da Lagoa,
à frente, uma estátua,
às minhas costas, a Cruz de Malta,
pela primeira vez meditei de olhos abertos,
pois me recusei a fechar as pálpebras diante de tanta
o ar era mais puro,
o vento mais brisa,
o céu mais azul,
as folhas mais verdes,
e nada disso é exagero,
pois nada era ficção
Naquele dia na Lagoa,
venci todos os meus medos,
embebido de toda coragem e de toda pureza,
virei um novo homem,
andei até a beirada,
sorri espontaneamente e proclamei:
“Cidade Maravilhosa, abro os meus braços para ti
Não sei quem sou,
o que gosto de fazer,
o que gosto de comer,
qual é o meu habitat natural,
se rodeado de gente
ou sozinho no meu quarto,
com quem ter,
se com mulheres ou com homens,
talvez unido aos dois pronomes,
talvez com todos os pronomes,
que depois eu nem consiga lembrar de todos os nomes,
uma loucura que me faça esquecer meus sobrenomes;
seria eu comedido ou desvairado?
Um sujeito incompreendido ou um espécime a ser
Sento no divã
ou pego papel e caneta?
Seria eu ambos,
maníaco e terapeuta?
Um homem de senhos brandos
e desejos bambos,
racional e intuitivo,
levando
seja com palavras ou com a pele,
não sei ao certo o que sentir,
na boca, o gosto do suor ou o da lágrima?
Respirar de peito aberto ou forçando o diafragma?
São muitos dilemas para um só homem;
escolho os meus rumos ou deixo que eles me tomem?
Parece que se desprendem as minhas costas,
estou a ermo;
com tantos contrastes é difícil encontrar o meio-termo
Je pense
Qu’est-ce que
Évidemment, je
frapper le mur,
vivre un amour,
écrire un
méditer,
m’éditer ;
je dois
en autre chose
Je m’ai trop
En vérité, je
être sans
je pense que je
je suis en
cars, je pense
je ne suis
je ne me
pour marcher à
La douleur
ça n'est pas un
la douleur est
laisse tomber,
le soleil se
se ci sont
rien à faire,
la douleur se
C’est ça.
Hoje, depois de acordar, me olhei no espelho e eu não estava lá,
era outro no reflexo,
irreconhecivelmente igual,
nem quem eu fui e nem quem eu quero ser,
era alguém que se perdeu
e foi parar em Icaraí,
alguém que não tinha o que era meu
e esqueceu de si,
que das próprias virtudes se desprendeu
e apagou tudo que vivi,
largou tudo que aprendi,
largou sua cidade para viver um sonho,
uma fagulha no breu;
descobriu na irmã um demônio,
e agora o próprio destino não é mais seu,
talvez nunca tenha sido,
e se da raiva tivesse se desprendido,
deixado-a partir,
se além disso alguma coisa conseguisse sentir,
se é só esquisitice ou de fato escondo o meu verdadeiro
se fosse mais eu
ou menos eu,
estaria ainda aqui
ou teria sido jogado aos leões do Coliseu?
Sou uma sacola vazia
que ficou por aí,
com o vento a me levar,
se tivesse algo para dar
trocaria por um coração fértil de amor
e a sabedoria de perdoar
Sofá,
pipoca,
um filme em preto e branco,
uma tarde de domingo,
o descanso merecido,
um recanto de amor por nós construído,
quatro lábios colados que nada parte,
Casablanca já não é no Marrocos,
agora fica em Marte
Dissolvido na cor dos teus olhos,
eu me sinto encasulado num segundo,
como uma borboleta prestes a voar
pela primeira vez,
os sonhos tomam conta do ar
e o teu rosto fica mais lindo a cada vez,
a tua pele me cobre como feitiço,
é a razão da minha vida,
a causa do meu sumiço,
perdido há tanto tempo em ti,
o mundo já não sente mais a minha falta
e eu já não sinto falta do mundo
Porque eu te amo
e não consigo deixar de te amar
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