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Museu do Homem mostra como descoberta de pinturas e gravuras rupestres abalou o século XX


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O Museu do Homem, em Paris, mostra como a descoberta de pinturas e gravuras rupestres abalou o início do século XX não só no âmbito da Ciência, mas também nas Artes e, sobretudo, na maneira como os homens primitivos eram vistos. A comissária da exposição, Egídia Souto, fez uma visita guiada, em exclusivo, para a RFI.

 

Até ao século XX nada se sabia no Mundo Ocidental sobre a faceta artística dos nossos antepassados. Graças a figuras como Henri Breuil ou Leo Frobenius, e às suas investigações no terreno, a sociedade dos anos 30 começou a interrogar-se sobre não só o que faziam, mas quem eram, o que sentiam e o que interpretavam artisticamente os primeiros homens que desenhavam nas cavernas.

Esta mediatização das pinturas e gravuras rupestres e o frenesim que provocou na época está patente no Museu do Homem, em Paris, através da exposição Pre-Histomania que pode ser vista até ao dia 20 de Maio.

A comissária da exposição. Egídia Souto, professora de literatura e historia da arte africana na Sorbonne, faz-nos a visita guiada a um passado mais próximo do que imaginamos.

"É uma exposição que retrato o percurso humano, de homens e mulheres, que acompanharam um etnólogo alemão, Leo Frobenius, que realizou 12 missões no início do século XX e que o acompanharam para fazer os levantamentos, fazer cópias, de grutas ou paredes rochosas onde havia pinturas da Pré-História. Copiaram-nas em tamanho real e trouxeram-nas para a Europa. Desde muito cedo, essas repoduções foram mostradas em mais de 30 cidades", explicou.

Na primeira sala, as paredes estão cobertas de grandes desenhos na Vertical e horizontal. É a escala das diferentes grutas exploradas pela equipa de Leo Frobenius. Egídia Souto falou-nos das mais significativas encontradas nas missões ao Zimbabwe, África do Sul e Lesotho.

"As grutas viajam muito mal. Até ao início do século XX, a pré-história resumia-se a cilex ou a pedras, então Leo Frobenius pediu às equipas para copiarem e era a primeira vez que se via o que havia nessas paredes", disse a académica.

Assim, depois de localizar as gravuras ou pinturas, a equipa tinha a tarefa de lá chegar. Muitas destas mulheres e homens, a maior parte muito jovem, tinham de aceder a grutas ou penhascos escalando ou caminhando longos período na floresta ou no deserto. Estas reproduções efetuadas na maior parte das vezes em condições adversas, são hoje o único registo do que existia nessas paredes, já que muitos destes lugares hoje já não existem.

Se muitas missões levaram a equipa de Leo Frobenius ou de Henri Breuil para longe, outras fizeram-se na Europa. Uma das mais significativas foi à gruta de Alta-Mira, em Espanha, com os contemporâneos destes académicos a não acreditarem à primeira que os homens primitivos eram capazes de produzir arte com tanto detalhe e delicadeza.

Egídia Souto explicou quem era afinal Leo Frobenius e qual o impacto das suas descobertas na Ciência, mas também nas artes e na percepção em geral do início da Humanidade.

"Leo Frobenius não era um especialista da pré-história, ele vai para África para fazer uma recolha de mitos e, desde logo, ele tem consciência que estes lugares [cavernas e/ou paredes com pinturas e gravuras] têm de ser copiados e preservados porque estão destinados a desaparecer", contou.

Um pioneiro, mas também um alemão, algo muito importante temporalmente já que em 1933 Adolf Hitler sobe ao poder e seis anos mais tarde começa a Segunda Guerra Mundial. O estudo do homem primitivo e a anatomia comparada serviram de arma ao regime nacional socialista em Berlim para manipular a opinião pública alemã e comprovar, através de teorias enviesadas, a supremacia da raça ariana.

Mesmo se Leo Frobenius foi dos primeiros estudiosos a falar sobre as civilizações africanas, mapeando os usos, costumes, mitos e arte de diferentes povos no continente, de forma a garantir a transparência sobre quem foi este homem e a sua proximidade ou não ao regime alemão, os comissários da exposição pediram uma avaliação independente sobre o envolvimento de Frobenius com os partidários do nazismo.

"Ele não era simpatizante, mas não se metia em questões políticas", explicou Egidia Souto.

As imagens de Frobenius deram a volta ao Mundo e foram mostradas no anos 30 no próprio Museu do Homem, em Paris, mas também no Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque. Estima-se que mestres do século XX como Picasso ou Miró tenham visto estas imagens e se tenam inspirado para as suas próprias obras. 

Estão recenseadas atualmente no Mundo cerca de 45 milhões de pinturas e gravuras rupestres, espalhadas por 160 países e há constantemente novas descobertas. Os métodos de estudo hoje estão muito longe dos decalques ou reproduções feitas pelas equipas de Henri Breuil ou Leo Frobenius, com recurso a tecnologia de ponta para estudar estas imagens. No entanto, o objetivo continua a ser o mesmo, não deixar que estas imagens desapareçam.

E, para isso, os artistas continuam hoje a interpreta-las, com a exposição a terminar com dois quadros de artistas contemporâneos: o senegalês Abdoulaye Diallo e a portuguesa Graça Morais.

A exposição Pre-histomania está patente até 20 de Maio no Museu do Homem, em Paris. 

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