Olá, bem vindos.
Estava, há dias, a conversar com uma amiga e dei por mim a numa abordagem distópica da vida que vivemos, para concluir que é esta a vida que estamos a viver e que é mesmo importante percebermos que tipo de ferramentas usamos e nas quais depositamos tanta informação de valor. Não é ficção científica, acrescentou.
E na verdade, parece ficção, mas é a realidade.
Chrissy Teigen abandonou o Twitter. O que interessa isso? Pouco, a não ser que saibamos que era das figuras mais respeitadas e seguidas desta rede, abandoando-a para garantir a sua sanidade mental.
Eu já equacionei muitas vezes abandonar, mas decidi ficar, aprendendo a lidar. Voltemos umas semanas atrás quando decidi abandonar o WhatsApp, que os mais próximos entenderam como, “lá está ela com a mania” e que os mais afastados nem se dão ao trabalho de tentar entender, continuando a escrever-me.
Se tenho as costas largas em relação ao que pensam de mim - na verdade, aprendi a ter as costas largas ou a atirar para trás das costas - por outro, a razão que me leva a ter estas atitudes pseudo-conspiratórias é chata e complexa, afasta a maior parte das pessoas porque, simplesmente, estamos tão inebriados pela sedução que as redes provocam em nós, aceitando, sem pensar, que entrem na nossa vida de forma muito despudorada, invasiva e avassaladora.
Esqueçam lá isso de serem viciantes, de manipularem as nossas ideias porque o problema é uma espécie de Matrix que se auto-alimenta para desenvolver e crescer.
De que estou a falar? De dados, da datasfera actual, com uma enorme quantidade de dados em circulação e da imensidão da informação sobre nós que entregamos, de mão beijada, a estas aplicações (sim, o meu livro também fala sobre isso). Porque razão deixei de usar o WhatsApp? Pela mesma razão que mantenho um perfil de Facebook sem o usar p-a-r-a-n-a-d-a. A conta existe, tem 0 informação sobre mim, não a uso para aceder a outras aplicações e não partilho nada no Facebook. Também revoguei o acesso de todas as apps ao Facebook. Porquê? Porque já dou demasiada informação ao Universo Zuckerberg através do Instagram, porque tinha dados sensíveis e confidenciais em circulação no WhatsApp os quais, por sua vez, diziam respeito a decisões estratégicas, para aplicar no instagram, de marcas com as quais trabalho. Informação essa que nos prejudicava quando aplicávamos a estratégia no Instagram. A perigosa e instável sofisticação da nossa vulnerabilidade.
Esta Matrix colecta, trata e categoriza dados de forma tão rápida que é impossível acompanharmos a sua velocidade de pensamento, razão pela qual antecipam as nossas acções (e pensamentos).
Então pergunto: sou eu que estou com a mania? Estamos perante um problema grave de autonomia e privacidade, num mundo dominado pelas maiores empresas de sempre, que criaram um contexto controlado por algoritmos de vigilância e persuasão velada, num processo que permite a estas empresas enriquecer cada vez mais, enquanto nos condicionam o comportamento.
Sou mesmo eu que “lá estou ela com coisas?”
Dei uma entrevista para um podcast no qual falámos sobre isto. O autor, informático de profissão, questionava-me sobre este admirável mundo novo no qual todos estamos sem saber ao que vamos, e eu expliquei que hoje, mais do que usar, importa saber usar para não sermos usados. E é por isso que questiono, tantas vezes, se ainda precisamos de redes sociais, as quais devemos, cada vez mais, usar com parcimónia (a palavra mais feia de sempre), conscientes do que lá vamos fazer, recorrendo a uma certa higiene mental que nos garante que seguimos cada vez menos e cada vez melhor, procurando não apenas o que está em linha com a nossa linha de pensamento, mas também aquilo que nos faz pensar, afastando-nos, cada vez mais do consumismo apelativo das montras digitais, que estimulam o que menos precisamos: a comparação, o sentirmo-nos mal ou inferiores, a desmotivação por não estamos alinhados com o que faz, tem ou mostra a maior parte das pessoas. É isso ou sair, a bem da nossa sanidade mental. E como ficar?
Definindo o objectivo da nossa permanência, estabelecendo limites à utilização e procurando a afirmação de que não são essenciais para viver, mas excelentes para comunicar.
Beijos, e até para a semana 💋
Na Sábado: Negacionistas da negação digital
E porque é o Dia do Livro Português sugiro o meu livro 🤣🤣🤣 agora a sério, sugiro mesmo um regresso ao passado, recuperando a Antologia “Mar” de Sophia de Mello Breyner Andresen, “Meu Amor Era de Noite” de Vasco Graça Moura, “Fora de Horas” de Paulo Castilho e “O Mundo é Tudo o que Acontece” de Pedro Paixão.
Leiam, viajem nas palavras e deixem-se ir. Bom fim de semana!
Última nota a quem quer mesmo comprar o meu livro nesta edição personalizada, com áudio e a surpresa especial: o prazo para reservarem a vossa edição especial termina no dia 5 de Abril.
This is a public episode. If you would like to discuss this with other subscribers or get access to bonus episodes, visit paulacordeiro.substack.com