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Desde o início da invasão russa, a Ucrânia vive em guerra com combates, perdas humanas e materiais. Nos últimos três anos, Kiev conta com o apoio militar e económico dos países aliados ocidentais, como os Estados Unidos. As tensões aumentaram com o encontro entre Donald Trump e Volodymyr Zelensky, marcado por acusações feitas pelo Presidente e pelo vice-presidente norte-americanos. Durante a visita à Casa Branca, o Presidente norte-americano criticou a gestão de Zelensky, exigiu mais gratidão pela ajuda dos EUA, acusou-o de estar a "apostar na Terceira Guerra Mundial".
RFI: O encontro de sexta-feira entre Volodymyr Zelensky e Donald Trump pode influenciar o apoio dos Estados Unidos à Ucrânia?
José Pedro Frazão, na Ucrânia, em serviço especial para a RFI: Sim, naturalmente, terá um impacto. Mas não está tudo perdido. A sensação aqui em Kiev, na Ucrânia, é que embora alguns tenham ficado preocupados com o nível de agressividade da conversa, há sinais de que nada está perdido, porque, aparentemente, as conversas continuam, os canais não foram cortados entre Washington e Kiev. Mas é verdade que, se os Estados Unidos cortarem essa "torneira" de defesa em relação à Ucrânia, será muito mais difícil.
Naturalmente, a Ucrânia continuará a sua ofensiva. Alguns deputados com quem falei nos últimos dias, depois desta conversa de Trump com Zelensky na Casa Branca, dizem que é preciso não sucumbir ao pessimismo e ser um pouco paciente com a administração Trump, lembrando que os resultados podem não ser imediatos. Além disso, há outra pista de entendimento com a União Europeia para tentar um reforço militar, que é aquilo que temos observado nos últimos dias. De certa forma, a Europa está a substituir os americanos no terreno ou, pelo menos, no apoio externo às forças ucranianas.
Como é que, no terreno, os ucranianos reagiram à exigência dos Estados Unidos de que Volodymyr Zelensky deixe o cargo de presidente?
O Presidente ucraniano, quando assinalou os três anos desta invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia, tinha levantado a possibilidade de se demitir caso a Ucrânia fosse aceite na NATO. Aliás, ele disse isso mesmo ontem, em Londres. A ideia de se demitir não é nova, mas é de difícil execução, porque se percebe que a NATO provavelmente não será a opção de garantia de segurança mais imediata.
Por outro lado, a verdade é que os ucranianos precisam de respostas imediatas. A substituição de um Presidente, ainda para mais num contexto de guerra, não parece ser muito viável. Do ponto de vista da população, a intervenção foi vista de forma positiva, mas é preciso notar que, quando os ucranianos olham para aquilo que está a acontecer, não é propriamente a questão da Presidência que está em causa. O Presidente que está actualmente em funções é quem está a defender o rumo da Ucrânia na guerra. Eu diria que ele reforçou a sua posição internamente, apesar dos riscos que corre. E, desse ponto de vista, por exemplo, é um pouco incongruente pedir a saída do Presidente ucraniano e, ao mesmo tempo, pedir eleições, porque, na verdade, em princípio, ele se candidataria a essas eleições e não sabemos o resultado. Para haver eleições é necessário acabar com a lei marcial e, depois, só cerca de seis meses depois dessa possibilidade poderia haver eleições. Se ele se recandidatasse, poderia ainda assim ter um resultado aceitável.
Os aliados europeus receberam Volodymyr Zelensky e, em Londres, a Europa mostrou que estava unida e ao lado da Ucrânia. A Europa quer apostar numa reconciliação entre Trump e Zelensky, mas prepara-se para agir sem o apoio dos Estados Unidos da América. Como é que reagiram os ucranianos ao encontro de ontem?
Os ucranianos entendem como inevitável que a Europa tome agora um pouco mais o cargo a defesa não só da Ucrânia, mas também do leste da Europa. Esta era a resposta que a Ucrânia esperava que a Europa desse. Simplesmente, todos estavam à espera do que Trump diria e de como seria a conversa entre Zelensky e Trump.
Essa conversa não correu bem numa primeira instância, o que activou os alarmes em vários governos europeus e levou à declaração de um novo plano de defesa. Vamos ver ao longo desta semana como se concretiza, mas, do ponto de vista militar, a Ucrânia olhar positivamente para isto.
A importância americana subsiste, nomeadamente na defesa aérea: Os sistemas aéreos são de origem norte-americana, como os mísseis Patriot, essenciais para defender o território ucraniano, e também os caças F-16. Alguns aliados da NATO operam estes aviões e precisam de autorizações dos Estados Unidos para a sua utilização.
É por isso que a Europa gostaria de contar com o apoio dos Estados Unidos. Os próximos dias irão clarificar se isso acontecerá, se a Europa assumirá a linha da frente, com um apoio americano. Seja como for, estes planos de defesa europeus são bem-vindos em Kiev. Em relação ao futuro da guerra, tudo está um pouco em aberto, dependendo da forma como esses reforços chegarão ao terreno.
Há diálogo, nesta altura, entre a Rússia e a Ucrânia?
É curioso perguntares isso, porque, há três anos, por esta altura, no início de Março, havia negociações na Bielorrússia entre russos e ucranianos. Não eram negociações de alto nível, mas havia conversas. Essas negociações foram sendo interrompidas ao longo das semanas e, hoje em dia, o diálogo é mínimo.
Actualmente, os contactos entre Rússia e Ucrânia limitam-se essencialmente à troca de prisioneiros, graças à mediação das Nações Unidas e da Santa Sé. Também poderá haver contactos ao nível da repatriação de crianças, mas essa questão ainda não está resolvida da mesma forma que a troca de prisioneiros de guerra.
Houve uma libertação de prisioneiros em Fevereiro, Zelensky está a distribuir imagens e deixou-as na Casa Branca, como um gesto simbólico da suposta vontade de Vladimir Putin de fazer a paz. No entanto, as últimas notícias vão noutra direcção. Nas últimas horas, por exemplo, surgiu a ideia de uma trégua de um mês como sinal de boa vontade da Rússia. No entanto, na Ucrânia, ninguém acredita nem em tréguas, nem em cessar-fogo. O receio é que uma pausa sirva apenas para a Rússia se rearmar e lançar novos ataques ainda mais profundos contra a Ucrânia.
Passados três anos de guerra, há perspetivas de negociações de paz? Notas um movimento de regresso de deslocados ou, pelo contrário, uma intensificação da saída de ucranianos para o estrangeiro: Qual é o grau de cansaço da população?
É uma sociedade fatigada com a guerra. Ainda há pessoas a sair das linhas da frente. Nos últimos dois dias, tive contacto com muitas pessoas que estão a abandonar estas zonas, nomeadamente de Pokrovsk e Kostiantynivka. Estamos a falar de populações que resistiram apesar dos fortes bombardeamentos, sobretudo os mais idosos. A maior parte das famílias com crianças já deixou estas zonas ao longo dos últimos três anos, algumas deslocando-se para a Ucrânia Ocidental e outras para o estrangeiro.
Neste momento, não há um grande êxodo de ucranianos para outros países europeus, ninguém acredita que a paz esteja próxima. A perspectiva ucraniana é continuar a lutar. Os ucranianos dizem que, se não forem eles a lutar, ninguém lutará por eles.
A economia está gravemente afectada e depende do apoio europeu para manter serviços públicos. Há uma geração inteira mobilizada para o combate. As mulheres enfrentam sobrecarga de trabalho, há e problemas de saúde mental. A corrupção na administração pública continua a ser um desafio. São várias as batalhas internas que os ucranianos enfrentam, além do inimigo comum: Vladimir Putin e a Rússia.
Desde o início da invasão russa, a Ucrânia vive em guerra com combates, perdas humanas e materiais. Nos últimos três anos, Kiev conta com o apoio militar e económico dos países aliados ocidentais, como os Estados Unidos. As tensões aumentaram com o encontro entre Donald Trump e Volodymyr Zelensky, marcado por acusações feitas pelo Presidente e pelo vice-presidente norte-americanos. Durante a visita à Casa Branca, o Presidente norte-americano criticou a gestão de Zelensky, exigiu mais gratidão pela ajuda dos EUA, acusou-o de estar a "apostar na Terceira Guerra Mundial".
RFI: O encontro de sexta-feira entre Volodymyr Zelensky e Donald Trump pode influenciar o apoio dos Estados Unidos à Ucrânia?
José Pedro Frazão, na Ucrânia, em serviço especial para a RFI: Sim, naturalmente, terá um impacto. Mas não está tudo perdido. A sensação aqui em Kiev, na Ucrânia, é que embora alguns tenham ficado preocupados com o nível de agressividade da conversa, há sinais de que nada está perdido, porque, aparentemente, as conversas continuam, os canais não foram cortados entre Washington e Kiev. Mas é verdade que, se os Estados Unidos cortarem essa "torneira" de defesa em relação à Ucrânia, será muito mais difícil.
Naturalmente, a Ucrânia continuará a sua ofensiva. Alguns deputados com quem falei nos últimos dias, depois desta conversa de Trump com Zelensky na Casa Branca, dizem que é preciso não sucumbir ao pessimismo e ser um pouco paciente com a administração Trump, lembrando que os resultados podem não ser imediatos. Além disso, há outra pista de entendimento com a União Europeia para tentar um reforço militar, que é aquilo que temos observado nos últimos dias. De certa forma, a Europa está a substituir os americanos no terreno ou, pelo menos, no apoio externo às forças ucranianas.
Como é que, no terreno, os ucranianos reagiram à exigência dos Estados Unidos de que Volodymyr Zelensky deixe o cargo de presidente?
O Presidente ucraniano, quando assinalou os três anos desta invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia, tinha levantado a possibilidade de se demitir caso a Ucrânia fosse aceite na NATO. Aliás, ele disse isso mesmo ontem, em Londres. A ideia de se demitir não é nova, mas é de difícil execução, porque se percebe que a NATO provavelmente não será a opção de garantia de segurança mais imediata.
Por outro lado, a verdade é que os ucranianos precisam de respostas imediatas. A substituição de um Presidente, ainda para mais num contexto de guerra, não parece ser muito viável. Do ponto de vista da população, a intervenção foi vista de forma positiva, mas é preciso notar que, quando os ucranianos olham para aquilo que está a acontecer, não é propriamente a questão da Presidência que está em causa. O Presidente que está actualmente em funções é quem está a defender o rumo da Ucrânia na guerra. Eu diria que ele reforçou a sua posição internamente, apesar dos riscos que corre. E, desse ponto de vista, por exemplo, é um pouco incongruente pedir a saída do Presidente ucraniano e, ao mesmo tempo, pedir eleições, porque, na verdade, em princípio, ele se candidataria a essas eleições e não sabemos o resultado. Para haver eleições é necessário acabar com a lei marcial e, depois, só cerca de seis meses depois dessa possibilidade poderia haver eleições. Se ele se recandidatasse, poderia ainda assim ter um resultado aceitável.
Os aliados europeus receberam Volodymyr Zelensky e, em Londres, a Europa mostrou que estava unida e ao lado da Ucrânia. A Europa quer apostar numa reconciliação entre Trump e Zelensky, mas prepara-se para agir sem o apoio dos Estados Unidos da América. Como é que reagiram os ucranianos ao encontro de ontem?
Os ucranianos entendem como inevitável que a Europa tome agora um pouco mais o cargo a defesa não só da Ucrânia, mas também do leste da Europa. Esta era a resposta que a Ucrânia esperava que a Europa desse. Simplesmente, todos estavam à espera do que Trump diria e de como seria a conversa entre Zelensky e Trump.
Essa conversa não correu bem numa primeira instância, o que activou os alarmes em vários governos europeus e levou à declaração de um novo plano de defesa. Vamos ver ao longo desta semana como se concretiza, mas, do ponto de vista militar, a Ucrânia olhar positivamente para isto.
A importância americana subsiste, nomeadamente na defesa aérea: Os sistemas aéreos são de origem norte-americana, como os mísseis Patriot, essenciais para defender o território ucraniano, e também os caças F-16. Alguns aliados da NATO operam estes aviões e precisam de autorizações dos Estados Unidos para a sua utilização.
É por isso que a Europa gostaria de contar com o apoio dos Estados Unidos. Os próximos dias irão clarificar se isso acontecerá, se a Europa assumirá a linha da frente, com um apoio americano. Seja como for, estes planos de defesa europeus são bem-vindos em Kiev. Em relação ao futuro da guerra, tudo está um pouco em aberto, dependendo da forma como esses reforços chegarão ao terreno.
Há diálogo, nesta altura, entre a Rússia e a Ucrânia?
É curioso perguntares isso, porque, há três anos, por esta altura, no início de Março, havia negociações na Bielorrússia entre russos e ucranianos. Não eram negociações de alto nível, mas havia conversas. Essas negociações foram sendo interrompidas ao longo das semanas e, hoje em dia, o diálogo é mínimo.
Actualmente, os contactos entre Rússia e Ucrânia limitam-se essencialmente à troca de prisioneiros, graças à mediação das Nações Unidas e da Santa Sé. Também poderá haver contactos ao nível da repatriação de crianças, mas essa questão ainda não está resolvida da mesma forma que a troca de prisioneiros de guerra.
Houve uma libertação de prisioneiros em Fevereiro, Zelensky está a distribuir imagens e deixou-as na Casa Branca, como um gesto simbólico da suposta vontade de Vladimir Putin de fazer a paz. No entanto, as últimas notícias vão noutra direcção. Nas últimas horas, por exemplo, surgiu a ideia de uma trégua de um mês como sinal de boa vontade da Rússia. No entanto, na Ucrânia, ninguém acredita nem em tréguas, nem em cessar-fogo. O receio é que uma pausa sirva apenas para a Rússia se rearmar e lançar novos ataques ainda mais profundos contra a Ucrânia.
Passados três anos de guerra, há perspetivas de negociações de paz? Notas um movimento de regresso de deslocados ou, pelo contrário, uma intensificação da saída de ucranianos para o estrangeiro: Qual é o grau de cansaço da população?
É uma sociedade fatigada com a guerra. Ainda há pessoas a sair das linhas da frente. Nos últimos dois dias, tive contacto com muitas pessoas que estão a abandonar estas zonas, nomeadamente de Pokrovsk e Kostiantynivka. Estamos a falar de populações que resistiram apesar dos fortes bombardeamentos, sobretudo os mais idosos. A maior parte das famílias com crianças já deixou estas zonas ao longo dos últimos três anos, algumas deslocando-se para a Ucrânia Ocidental e outras para o estrangeiro.
Neste momento, não há um grande êxodo de ucranianos para outros países europeus, ninguém acredita que a paz esteja próxima. A perspectiva ucraniana é continuar a lutar. Os ucranianos dizem que, se não forem eles a lutar, ninguém lutará por eles.
A economia está gravemente afectada e depende do apoio europeu para manter serviços públicos. Há uma geração inteira mobilizada para o combate. As mulheres enfrentam sobrecarga de trabalho, há e problemas de saúde mental. A corrupção na administração pública continua a ser um desafio. São várias as batalhas internas que os ucranianos enfrentam, além do inimigo comum: Vladimir Putin e a Rússia.
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