Na manhã desta segunda-feira, os mercados financeiros dos Estados Unidos entraram num estado de nervosismo estranho e surpreendente. Uma start-up chinesa de que ninguém ouvira falar, a DeepSeek, tinha desenvolvido uma ferramenta de inteligência artificial que prometia mudar uma área da ciência e da tecnologia até agora dominada pelos gigantes norte-americanos.
De repente, as acções da mais valiosa empresa do mundo, a NVIDIA, que fabrica chips para a inteligência artificial, entraram em queda e, no final do dia, o valor da companhia tinha perdido o equivalente ao dobro do produto interno bruto de Portugal. O choque e o pavor passaram pela banca, pelos mercados, pelos fóruns da ciência e chegou à Casa Branca. O sempre arrogante Donald Trump lá teve de interpretar o tremor de terra como uma chamada de despertar para a América: a China estava a dar cartas numa indústria do futuro.
Já se sabia há muito que, em áreas que vão dos automóveis eléctricos às energias verdes ou ao computer clouding, a China deixara de ser a fábrica de pechisbeque das lojas dos 300. Mas dificilmente um leigo poderia prever a pequena revolução da DeepSeek. Uma empresa iniciada há cinco anos investiu na contratação de jovens chineses talentosos e apostou na investigação de raiz até chegar a uma solução para a inteligência artificial que dispensa os padrões dos norte-americanos. O que eles fizeram foi espantoso: num estudo de 22 páginas divulgado para todo o mundo, mostraram que com pouco mais de 2000 chips, e um investimento de cinco milhões de euros conseguiam produzir um modelo de inteligência artificial capaz de competir com os modelos das gigantes tecnológicas americanas. A inteligência artificial foi dessacralizada.
Depois da surpresa, o espanto. Aquilo que a DeepSeek afirmava era verdade, não era propaganda. A tentativa do Washington de atrasar os chineses, proibindo a exportação dos chips da NVIDIA, tornara-se risível. A companhia tinha desenvolvido um código que permitia a aprendizagem da linguagem, que gerava inteligência artificial, de uma forma muito mais barata e eficiente. A China tinha entrado para a vanguarda das tecnologias do futuro. Nada será como antes, mesmo que haja dúvidas legítimas sobre o papel que uma ferramenta de AI tutelada pelo estado chinês possa ter ao nível da desinformação e da manipulação das opiniões públicas. Como o The Guardian constatou, para a DeepSeek, Taiwan é território inalienável da China.
Para analisarmos o que está em causa, convidámos para este episódio do P24 o professor Arlindo Oliveira, do Instituto Superior Técnico, que é também presidente do INESC e autor, entre muitos outros, do livro Inteligência Artificial Generativa publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos.
See omnystudio.com/listener for privacy information.